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Há 50 anos chovia carne e sangue no Vale do Paraíba em São Paulo, por Cláudio Tsuyoshi Suenaga clovismoliveira.wordpress.com
22 de agosto de 201909/04/2024 11:30:14

Há pouco mais de 50 anos, os motoristas que em 15 de agosto de 1968 trafegavam pela Rodovia Federal BR-116, a Presidente Dutra ou Via Dutra (estrada que liga São Paulo ao Rio de Janeiro no sentido leste-oeste) entre as cidades de Caçapava e São José dos Campos (distantes 22 quilômetros uma da outra), na mesorregião do Vale do Paraíba, foram surpreendidos por uma tempestade que durou cerca de sete minutos.

Mas não era água que desabava, visto que não havia nuvens no céu. Deslocando-se ao local, o deputado Marcondes Ferreira deparou-se com uma área de um quilômetro quadrado coberta de carne e sangue. Os jornais paulistas registraram que o tamanho dos pedaços de carne – alguns em formato de cubo – de textura esponjosa e cor arroxeada, variava entre 5 e 15 centímetros, distando aproximadamente 50 centímetros uns dos outros. O sangue escorria das postas. O céu estava claro e limpo, nenhum avião cruzara a região antes ou durante o fato, e não havia urubus por perto. Diante disso, a Polícia removeu discretamente o material e encerrou o caso, classificando-o como “inexplicável”.[1]O jornal Notícias Populares, em sua edição de sexta-feira, 30 de agosto de 1968, trouxe na primeira página uma das mais manchetes mais estranhas já vistas e que sem dúvida deixaria Charles Fort extasiado: “Chuva de Sangue e Carne em S. Paulo”.[2] Apesar de ser tido como um veículo sensacionalista, o jornal nada mais fez do que reportar corretamente os fatos, informando que “uma chuva de carne e sangue ocorreu há dias no distrito de Eugênio de Melo, em São José dos Campos, mobilizando a Polícia local para apurar a origem do fenômeno. Segundo o deputado Marcondes Ferreira, […] vários moradores daquela localidade, no dia da ocorrência, viram pedaços de carne e gotas de sangue caindo do céu, sem que qualquer avião ou helicóptero tivesse passado pelo local. Chamada a Polícia, foram recolhidas amostras de carne e encaminhadas para exame, cujos resultados ainda não são conhecidos.”A incrível manchete do jornal Notícias Populares em sua edição de 30 de agosto de 1968. Fonte: Arquivos de Cláudio Suenaga.Os pedaços eram do tamanho de bifes pequenos, tinham cor arroxeada e consistência esponjosa. Não pareciam ser de aves, porquanto não havia sinais de penas. Foram humildes trabalhadores que viram o fenômeno, numa área de aproximadamente um quilômetro quadrado, não havendo razão para suspeita de mistificação.A 9 quilômetros da Rodovia Presidente Dutra, na olaria de propriedade de Pedro Marinho de Sousa, os repórteres do jornal ouviram, na tarde de quinta-feira, 29 de agosto, alguns operários que haviam presenciado a chuva de carne e sangue que provocou o pânico entre algumas famílias por cerca de cinco minutos. Vicente Rodrigues, residente no Bairro da Grama, em Caçapava, relatou que estava assentando tijolos numa construção da olaria, quando começou a chuva de carne e sangue que apavorou a todos, inclusive velhos e crianças. Pedaços medindo de 5 a 20 centímetros caíram numa distância de meio metro cada um, sendo que uma posta de carne atingiu a cabeça do entrevistado. Afirmou Vicente Rodrigues que era católico e nunca vira coisa igual em sua vida, e tinha certeza de que o céu estava limpo e nenhuma ave passava sobre o local no momento.Os empregados da olaria, estatelados, entraram em pânico e criaram um pandemônio ao verem os pedaços de carne viva, sangrando, que caíam sobre as telhas e tijolos, interpretando o fato como a chegada do Apocalipse: “Patrão do Céu, está chovendo sangue!” Com uma expressão de espanto, José Aparecido, 17 anos, desandou a correr de medo. Caíram-lhe sobre a cabeça e os braços, gotas de sangue, de vermelho-arroxeado, bem forte. Pedro Marinho, ao ver Marcos dos Santos, 15 anos, correndo espavorido, gritou: “Deve ser castigo do céu! Hoje é dia Santo e eu fiz os meus empregados trabalhar!”José e Marcos fugiram espavoridos quando começou a cair carne e sangue, como chuva na Olaria de Pedro, no Bairro do Paiol. Marcos gritava: “Patrão do Céu, é o fim do mundo, está chovendo sangue!” Foto: Notícias Populares, dos Arquivos de Cláudio Suenaga.Gotejava sangue na olaria do Bairro do Paiol, no distrito de Eugênio de Melo, em São José dos Campos. Eram 12h30. O céu limpo, sem nuvens, sem aves de rapina à espera de presas. Todos passaram a fitar o firmamento azulado, quase sem nuvens. Não viram nada. Nem aves, nem aviões. Foi aí que Rosalina Moreira Ramos correu para avisar o marido que amassava barro: “Olha. É o fim do mundo, João. Lá em casa, à beira da porta, tem pedaços de carne e pingos de sangue.” João quase perdia toda cor bronzeada de Sol. Estava branco, como uma pétala de margarida. Apalpando-se todo para ver se estava sonhando ou acordado mesmo. Parecia miragem, alucinação. Mas não era. Todos os outros se abaixavam para ver os pedaços de carne, da cor do fígado, sem osso e sem penas. Sem nada. Carne moída, como se fosse triturada pela hélice de um avião. Mas, depois, refeitos do susto, foram raciocinando: “Vai, aqui não passa avião, nunca passou avião. Se ele pegasse uma ave, onde é que foram parar as penas? É só carne. Isso é maldição mesmo. O diabo tá solto.”O proprietário da olaria ficou com a “pulga atrás da orelha”. Aquilo não era normal. Saiu na olaria no Bairro do Paiol e foi ao distrito de Eugênio de Melo. Lá entrou no Bar Pinguim e contou ao dono, Nelson dos Santos, que ponderou: “Não espera nem um minuto. Vai na Polícia, porque isso não é brincadeira. Já pensou que encrenca vai dar se souberem da morte de alguém lá por perto? Vai falar com o soldado Ferdinando. Explica o caso.” Pedro repetiu a história na Polícia. Ela não quis acreditar mas foi ver. O perito Romildo, com auxílio da Polícia Técnica, recolheu os pedaços de carne. Os escrivães Ronaldo e Barreti tomaram os depoimentos. Era negócio sério. A carne e o sangue caíram sobre o mato e telhado de casas muito modestas, num raio de 500 metros. Depois da Polícia foram os curiosos. Gente de São José dos Campos, de Caçapava, de Taubaté, do Rio de Janeiro e de São Paulo. Mais de mil pessoas em poucas horas.Vicente Borges de Siqueira, que trabalhava na construção de um forno da olaria, disse que, ao cair um pedaço de carne no braço, deixou escapar o tijolo, de susto: “A carne estava sangrando. Parecia fígado, de marrom escuro. Aí, com os gritos dos companheiros, vi que caía sangue e carne por todos os lados. Olhei para cima e no céu não havia nada. Nem aves, nem aviões. Aqui é muito raro passar um. Isso é que nos deu medo e confesso que minhas pernas começaram a tremer. A carne não tinha mau cheiro. Era um pouco gelatinosa, esquisita. Caiu por uns dois ou três minutos. Depois observamos mais uma curiosidade. Ela secou no Sol e não deu mau cheiro nenhum.”Para João Vidal Ramos, era mesmo “coisa do outro mundo”: “Moro aqui há muitos anos. Nunca passou um avião por cima desta olaria. Passa bem longe, lá perto da serra. Aqui nunca passou. Não acredito nessa história de que avião apanhou urubu. Se apanhou corvo, junto com a carne devia cair as penas. Isso é maldição mesmo. É coisa do outro mundo.”[3]O vigário da Paróquia de Eugênio de Melo, o padre francês Marcel Merck, declarou à reportagem que:“1) Reside a dois quilômetros do local e nunca soube da presença de aviões nas imediações;2) Tomou conhecimento de um outro ‘mistério’, a poucos metros do local, de uma mulher cujas roupas se incendiavam sem a presença de fogo no recinto, de forma misteriosa. Não se incendiavam as roupas do marido e dos filhos, só as dela;3) Entende que são misteriosos acontecimentos que o homem ainda não consegue esclarecer.”A rota aérea Rio-São Paulo era feita pelo litoral, até o Morro do Papagaio, a mais de dois quilômetros de altitude, portanto distante de Eugênio de Melo mais de 100 quilômetros. Nenhuma delegacia registrou qualquer acidente em pedreiras situadas no Vale do Paraíba. Segundo alguns, poderia ter ocorrido alguma explosão de dinamite e o consequente lançamento dos pedaços de um dos empregados pelos ares. Mas a pedreira mais próxima localizava-se a mais de 20 quilômetros, o que afastava essa hipótese. Os moradores daquele lugar ermo, com pouquíssimas casas sem iluminação elétrica, passaram a se recolherem logo ao entardecer. Temiam “dar de cara” com o demônio, apesar de Pedro Marinho ter mandado rezar uma missa e benzer a olaria.[4]Por incrível que pareça, voltaria a chover carne e sangue na mesma região do Vale do Paraíba 25 dias depois. Na terça-feira, 10 de setembro, milhares de pessoas do distrito de Santa Luzia, a cerca de 40 quilômetros de Eugênio de Melo, entre Caçapava e Piedade, presenciaram espantados o fato. Como da outra vez, a chuva registrou-se ao meio-dia, com o céu totalmente limpo e um Sol abrasador. Armando Silva cuidava de uma plantação de arroz, quase nas margens do Rio Paraíba, quando chamou a atenção dos companheiros de roça para as manchas de sangue que salpicavam sua camisa. Outros colonos agrícolas verificaram que estavam também com as roupas salpicadas de sangue. Alarmados, saíram correndo para alertarem outros moradores das cercanias. Da mesma maneira que os moradores da olaria onde caiu carne e sangue, os agricultores atribuíram o fato a uma maldição.O jornal Notícias Populares noticiava em sua edição de 15 de setembro de 1968, à página 2, a repetição do incrível, a volta da chuva de carne e sangue no Vale do Paraíba. Fonte: Arquivos de Cláudio Suenaga.Os pedaços de carne que caíram em Santa Luzia eram do mesmo tamanho, isto é, com 2 a 3 centímetros, de coloração marrom, da cor do fígado e, curiosamente, gelatinosa. A carne não apresentava odor desagradável, mesmo depois de três dias exposta ao Sol. A chuva durou de três a quatro minutos, rendendo uma quantidade de carne avaliada em 3,5 quilos.Amostras foram recolhidas por curiosos e pesquisadores do fenômeno. O chefe dos escrivães de Polícia de Taubaté, Ronaldo Dias, disse que as carnes foram examinadas por um perito da Polícia Técnica lotado na Delegacia Regional de São José dos Campos, que as encaminhou, em seguida, ao IML de São Paulo para a obtenção de um laudo minucioso. Da mesma forma, é bom que se frise, o local onde pela segunda vez choveu carne e sangue não se situava dentro da rota aérea São Paulo-Rio, pois as viagens de avião eram feitas pelo litoral, a partir de Ubatuba. Isso afasta qualquer hipótese de uma ave ter sido triturada por um avião, e mais ainda: a carne vinda do espaço, destituída de ossos e penas, caiu em diferentes pontos, perfazendo um círculo.[5]Foto: Notícias Populares, 15-09-1968, p.16. Arquivos de Cláudio Suenaga.O Laboratório de Anatomia, Patologia e Microscopia Legal do Estado, após proceder exames nas amostras colhidas no Bairro da Olaria, em Caçapava, e no Bairro do Paiol, em São José dos Campos, concluiu que a carne que caiu no Vale do Paraíba era de mamífero do sexo feminino. O laudo da análise procedida pelo IML de São Paulo chegou à Delegacia de Polícia de São José dos Campos em 12 de outubro. O documento foi assinado pelo médico Ferdinando de Queiroz Costa que descreve o material examinado como sendo “coração e rim de mamífero do sexo feminino”. O exame limitou-se aos tecidos. Somente um exame mais apurado poderia fornecer respostas conclusivas. O IML procedeu a esse exame mas não revelou a quem ou o que pertencia a carne que “caiu do céu” em Caçapava e São José dos Campos.[6]O Laboratório de Anatomia, Patologia e Microscopia Legal do Estado, após proceder exames nas amostras colhidas no Bairro da Olaria, em Caçapava, e no Bairro do Paiol, em São José dos Campos, concluiu que a carne que caiu no Vale do Paraíba era de mamífero do sexo feminino! Fonte: Notícias Populares, 13-10-1968, p.6. Arquivos de Cláudio Suenaga.A presença de sangue, quase sempre, reflete um quadro de sofrimento a que as camadas menos privilegiadas e mais sofredoras da população vivem submetidas, implicando em um ato de desespero projetado no ambiente externo. O sangue é a fonte da vida, a força e a energia, e portanto comporta diversos significados sagrados. Tribos primitivas sorviam a hemoglobina dos inimigos para fortalecer seus corpos e espíritos. Mas se de um lado diz respeito à vida, do outro denota a banalização da violência, prenunciando genocídios. Para os cristãos, desde o sangue derramado por Cristo no Gólgota até as estátuas da Virgem Maria que choram sangue e as hóstias que se convertem nesse elemento, trata-se de uma esperança derradeira que se insurge ante situações limite, nas quais apelam-se às potências divinas. Investida de um sentido mítico, o sangue torna-se os principal motivo da exacerbação da fé ou da conversão.Com efeito, a linguagem religiosa, com seus signos, ao produzir conhecimentos sobre o mundo, converte-se em instrumento de compreensão de problemas e da forma como esses se relacionam com o mundo. É uma maneira particularizada de expressar as contradições que se encerram em meio às dificuldades enfrentadas. As camadas populares, por si mesmas, são capazes de criar práticas culturais próprias que não estão restritas somente aos limites impostos pela ordem hegemônica, que nem sempre fornece parâmetros adequados para o enfrentamento de determinadas questões.Notas:[1] “Casos malditos”, in Planeta, São Paulo, Ed. Três, nº 3, novembro de 1972, p.7.[2] “Chuva de sangue e carne em S. Paulo”, in Notícias Populares, São Paulo, ano V, nº 1.558, 30-8-1968, primeira página e p.11.[3] Jorge, Moacyr. “Choveu sangue porque foi castigo dos céus”, in Notícias Populares, São Paulo, ano V, nº 1.559, 31-8-1968, p.10.[4] IDEM, “Chuva de sangue e mulher que pega fogo assustam o Vale do Paraíba”, in Notícias Populares, São Paulo, ano V, nº 1.560, 1º-9-1968, p.3.[5] “Voltou a chover carne e sangue no Vale do Paraíba”, in Notícias Populares, São Paulo, nº 1.574, ano V, 15-9-1968, p.2.[6] “Médico-legista confirma: carne que caiu do céu era do sexo feminino!”, in Notícias Populares, São Paulo, nº 1.602, ano V, domingo, 13-10-1968, p.6.Extra: Matéria “Lluvias de sangre”, da autoria de Cláudio Tsuyoshi Suenaga, publicada na revista espanhola Enigmas, nº 128, año XII, julho de 2006.
Há 50 anos chovia carne e sangue no Vale do Paraíba em São Paulo, por Cláudio Tsuyoshi Suenaga clovismoliveira.wordpress.com

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Pelo estudo feito neste parágrafo, baseado nos documentos autênticos locais, deve-se concluir que nenhum dos Afonsos Sardinhas teve propriedade em Jaraguá; que a fazenda de Afonso Sardinha, o velho, onde ele morava e tinha trapiches de açúcar estavam nas margens do rio Jerobativa, hoje rio Pinheiros, e mais que a sesmaria que obtivera em 1607 no Butantã nada rendia e que todos os seus bens foram doados à Companhia de Jesus e confiscados pela Fazenda Real em 1762 em São Paulo. Se casa nesta sesmaria houvesse, deveria ser obra dos jesuítas. Pelo mesmo estudo se conclui que Afonso Sardinha, o moço, em 1609 ainda tinha a sua tapera em Embuaçava, terras doadas por seu pai. Não poderia ter 80.000 cruzados em ouro em pó, enterrados em botelhas de barro. Quem possuísse tal fortuna não faria entradas no sertão descaroável nem deixaria seus filhos na miséria. [“Na capitania de São Vicente”. Washington Luís (1869-1957), 11° presidente do Brasil. Página 202

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