Wildcard SSL Certificates
1908
1909
1910
1911
1912
1913
1914
1915
1916
Registros (59)



Joseph Jubert: preso, torturado e morto por querer educar trabalhadores
191204/04/2024 17:12:18

Joseph Jubert
Data: 01/01/1912
(@)(!)

O período da República Velha foi marcado por intensos conflitos e mudanças sociais no Brasil. Era uma época em que grandes donos de terras, obrigados a substituir a mão de obra escravizada pela assalariada, enfrentaram ondas de insatisfação de trabalhadores - e rebeliões - em vários pontos do país. Uma época que produziu importantes figuras, mas que são desconhecidas pela história oficial.

É o caso de Joseph Jubert, um professor e advogado francês que enfrentou fazendeiros e desafiou autoridades por melhores condições de trabalho nas lavouras. Por isso, foi tachado de "vagabundo", "perigoso e com intuitos subversivos".

Após projetar escolas para trabalhadores e seus filhos, que seguiriam uma linha de ensino distante dos dogmas da instituição e mais próxima da ciência, entrou em confronto com membros da Igreja Católica.

Quando defendeu uma paralisação de trabalhadores nas fazendas de café, jornais da época cobraram "providências justas da polícia pela paz e prosperidade da terra", enquanto era intimidado no Judiciário por "interferir na atividade econômica" e "iludir os colonos".

Recebeu o apelido de "o terrível anarquista", por mais que registros da época mostrem um sujeito culto e distante de qualquer ato de violência.

Perseguido, Jubert respondeu diversos processos durante suas passagens por cidades do interior de São Paulo. Graças às essas ações, foi preso, torturado e, também, apagado da história.

"O terrível anarquista"

Jubert nasceu em Lyon por volta de 1876 e veio ao Brasil ainda criança, em um período de intensa imigração de trabalhadores assalariados europeus, que chegavam ao país para substituir a mão de obra escravizada nas fazendas. Muitos deles acabaram enganados sobre as reais condições encontradas por aqui.

"A maior parte [dos estrangeiros] vinha na expectativa de possuir terras e fugir da fome. Quando chegam aqui e são jogados para trabalhar nos cafezais, passam por maus tratos, dívidas com os armazéns, e muitos desses colonos vão se rebelar", conta Ricardo Rugai, doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP).

É nesse contexto, de desapontamento e abusos sofridos pelos colonos, é que as ideias de afronta à ordem vigente ganham força - e que Jubert inicia sua politização.

"A ideia dominante era a de que anarquistas, comunistas, sindicalistas e qualquer outro ator político tenham vindo para cá já politizados. Mas, na verdade, a maioria dos europeus se tornou anarquista, por exemplo, aqui no Brasil", conta Rugai.

Jubert se aproximou dos anarquistas, mas não se reconhecia como um deles.

"Ele era contra o poder do Estado, da Igreja e da propriedade privada. Mas se declara um livre pensador", afirma Sandra de Souza, que estudou a história de Jubert durante o mestrado pela Universidade São Francisco (USF).

A distância inicial, porém, não o livrou de ser tachado de perigoso. Logo, o francês foi apelidado de "o terrível anarquista", alcunhada dada por um jornal, e passou a sofrer perseguições de representantes da oligarquia rural.

"A maior parte [dos estrangeiros] vinha na expectativa de possuir terras e fugir da fome. Quando chegam aqui e são jogados para trabalhar nos cafezais, passam por maus tratos", explica o historiador Ricardo Rugai

Problemas com a Justiça

O primeiro local em que Jubert teve problemas por causa de suas contestações é Atibaia, cidade no interior de São Paulo com milhares de imigrantes trabalhando nas lavouras.

Em meio a discussões sobre as novas relações de trabalho e seus consequentes conflitos, o francês, que atuava como professor e advogado, começou a enfrentar dificuldades.

Em 1907, ele foi processado pelo Judiciário local, com base no artigo 399 do Código Penal da época, por não possuir emprego fixo, sendo taxado como vagabundo e vadio pela sociedade da cidade, já que o processo era público.

Ao longo de sua trajetória no Brasil, ele responderia ainda a outros processos como forma de intimidação pelas suas atividades.

"Os processos eram utilizados para conter os chamados agitadores", diz Souza.

Mudança e perseguição

Após ser processado em Atibaia, e estima-se que absolvido, Jubert se muda para a vizinha Bragança Paulista como forma de diminuir a pressão sobre ele. Distante apenas 25 quilômetros, a nova cidade era famosa pelas fazendas de café e abrigo de milhares de imigrantes, principalmente italianos e portugueses. Um cenário fértil para a divulgação das novas ideias.

Ali, o francês ajudou a fundar a Liga Operária, uma associação que lutava por melhores condições de trabalho, salário mínimo e definição de jornada máxima, em um período no qual as leis trabalhistas ainda não existiam.

Após distribuir um boletim da Liga, escrito em português e italiano, com tais reivindicações, Jubert foi processado por fazendeiros locais como forma de intimidação por "iludir a boa fé dos colonos e causar uma paralisação forçada". O processo foi baseado no artigo 205 do Código Criminal da época que previa penas de prisão por "causar suspensão do trabalho para impor aos operários ou patrões aumento ou diminuição de serviço ou salário".

Segundo os produtores rurais, a intenção do professor para com os trabalhadores estrangeiros era "despertar-lhes paixões ruins, visando desviá-los dos trabalho, incitando à greve", de acordo com o processo, de 1911.

"Ou seja, para a Justiça, o operariado não possuía vontade própria, [os trabalhadores] estavam sendo enganados", conta Sandra. Os acusadores eram os fazendeiros Olympio Barra, Theophilo Francisco da Silva Leme e Felippe Rodrigues de Siqueira - os dois últimos deram seu nomes a vias importantes da cidade até hoje.

Para além da pressão dos donos de fazendas, a imprensa também auxiliava a proteger o status quo. Em artigo, o jornal Cidade de Bragança aconselha os colonos a "não serem ingratos para os patrões que lhe estimam e que não venham servir a anarquia social".

Jubert dispensou advogados no caso e fez a própria defesa, mostrando plenos conhecimentos jurídicos. Mas, com a pressão dos fazendeiros, juízes das comarcas próximas davam indicativos de que o professor seria considerado culpado por forçar os trabalhadores a pararem.

Mas, dado o parentesco e as ligações próximas dos julgadores com os acusadores, os três primeiros juízes foram considerados impedidos, graças aos recursos impetrados pela defesa. Assim, foi-se necessário a nomeação de um quarto juiz, da cidade de Jundiaí, que considerou a denúncia improcedente.

Em pouco tempo, entretanto, diversas greves foram registradas no município, mobilizando cerca de mil colonos em sete fazendas da região, fazendo com que o conflito social se agravasse.

Educação versus Igreja

Após essas paralisações do trabalho, a pressão ficou cada vez mais forte e o cerco ao francês se apertou.

Outra ideia do francês a causar polêmica foi o plano de fundar uma escola para os trabalhadores e seus filhos.

Chamadas de Escolas Modernas, as instituições eram inspiradas nas ideias do pedagogista anarquista espanhol Francisco Ferrer y Guardia. Esse método previa que meninos e meninas estudariam juntos (até então uma inovação), defendia o fim dos exames e dos castigos e, principalmente, uma educação com pouco espaço para o ensino religioso.

"O modelo de Ferrer é, justamente, uma educação que tenha por base um modelo científico aos estudantes", diz Silvio Gallo, professor doutor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

"É a razão contra o dogma. A ideia era contrapor a coisa pragmática com uma educação científica. Ferrer defende uma coeducação das classes, uma igualdade entre homens e mulheres e que eles deveriam ser educados juntos", afirma Gallo.

O plano da escola fez com que Jubert virasse alvo também da Igreja Católica na cidade, que, por meio do Centro Católico, associação destinada à defesa da religião, recebia recursos municipais para bancar a única escola da região.Um padre chamado Leonardo Gioiele, vigário de uma das paróquias e vice-presidente da associação, processou Jubert sob acusação de calúnia e injúria, após o francês iniciar uma agenda de conflitos com o padre por causa dos rumos da educação na cidade.

Em artigo de jornal, o professor foi além e criticou a postura do padre em relação a vida social afirmando, em artigo no jornal A Lanterna, de 1910, que "padre Leonardo, que como um anjo de bondade, foi surpreendido no quintal de uma família, ao pé de uma jabuticabeira, a espera de administrar a sua bondade a certa mulher casada".

O Centro Católico era presidido por um dos fazendeiros responsáveis pelo primeiro processo contra francês em Bragança, acerca da distribuição dos boletins, o que dá uma ideia de como o poder econômico e a Igreja andavam de mãos dadas na época.

"Esse processo por injúria continua na mesma forma de intimidação feita pelos aliados, fazendeiros e membros da igreja, em cima de Jubert", diz Sandra de Souza.

Ele denunciou ao jornal A Lanterna, no início de 1911, que vinha sofrendo ameaças por meio de cartas anônimas e recados. Também afirmou que foi convidado a acompanhar policiais até a delegacia da cidade, onde foi revistado e ameaçado pelo delegado caso continuasse a falar do padre.

Nessa ação do padre e seus aliados, Jubert é condenado a cinco meses de prisão e ao pagamento de uma multa de cerca de quatrocentos mil réis, um valor considerável à época e, praticamente, impossível de ser obtido por um trabalhador.

Sorocaba, prisão e tortura

Após ter sido condenado, Jubert se mudou a Sorocaba como forma de fugir da punição. A cidade contava com grandes tecelagens e um amplo comércio de gado graças à ferrovia que a ligava a Santos. Ele passou então a dar aulas, por três anos, em uma Escola Moderna que já funcionava por lá.

Paralelamente, o professor também auxiliou a abertura de outra Liga Operária na região. Em 1912, esteve à frente da defesa de operários que trabalhavam na cidade de Votorantim, onde, após a confusão inicial, um promotor de justiça tentou expulsá-lo da cidade.

Segundo Jubert, em artigo no jornal A Lanterna, de 1912, as ameaças de deportação eram constantes, mesmo que ele tivesse cidadania brasileira e fosse apto a votar.

No ano seguinte, o jornal Correio Paulistano relata que Jubert, chamado de "anarquista perigoso e com intuitos subversivos" pelo periódico, é preso após o desfecho de uma ação por calúnia e difamação promovida por um advogado, Octávio Guimarães, após Jubert ter discutido com Guimarães nas páginas dos jornais locais, trocando artigos acusatórios sobre educação.

Mesmo com a sentença, Jubert vai à delegacia pedir autorização para um comício, ignorando o resultado do julgamento sobre esse processo por calúnia. O comício, claro, não ocorreu.

Torturado nos primeiros dias de prisão em São Paulo, para onde foi mandado, o professor ficou preso em uma pequena cela, só podia ler livros religiosos e era proibido de ler. Os carcereiros locais também molhavam o chão da cela duas vezes por dia, o que o impedia de deitar e o fez desenvolver artrite.

Após a prisão de Jubert, anarquistas de todo o país fizeram uma campanha por sua libertação e buscarem doações para auxiliar o pagamento das multas impostas pela Justiça. Só depois de quatro meses, Jubert é libertado, quando decidiu retornar ao interior.

Depois de Sorocaba, o professor seguiu para Bauru, onde se tornou responsável pela Escola Moderna da cidade, além de lecionar nas de Taquaritinga e Cândido Rodrigues. Ali, continuou a busca por inaugurar centros destinados à educação.

Jubert morreu por volta de 1945, na capital, após uma vida marcada pela contestação do poder. Mesmo com a trajetória de lutas a favor dos trabalhadores e da educação, histórias como a de Joseph Jubert permanecem escondidas do cenário nacional.

"Há um trabalho de ocultamento de memória de lutas, do poder vigente no Brasil, há muito tempo", analisa Ricardo Rugai.

Além da censura do Estado, para o historiador, a hegemonia do Partido Comunista Brasileiro na esquerda, a partir da década de 1930, faz com que a história do anarquismo no Brasil anterior a essa década fosse deixada de lado, perdendo força social.

"Para além do governo e das fontes oficiais, que ocultam muito histórias como a dele, o PCB também fez um trabalho de ocultamento do anarquismo e suas vertentes, ignorando-os ou fazendo críticas pesadas a esses personagens", conclui.

BBC News
* Joseph Jubert: preso, torturado e morto por querer educar trabalhadores

Relacionamentos
-
Cidades (2)
sem imagemtesteAtibaia/SP35 registros
testeSorocaba/SP10973 registros
-
Temas (3)
testeCasos chocantes
103 registros
testeGreves
38 registros
erroc2:testeSalário mínimo
29 registros
Você sabia?
Caminho Itu só 1604
QUEM É O ÚNICO ENVOLVIDO NO ASSALTO AO BANCO CENTRAL QUE NÃO FOI PRESO? FABIO PREVIDELLI, em aventurasnahistoria.uol.com.br
27963
368
Como explicar a colonização ter iniciado-se na América e não na África? A África era mais próxima e a conheciam melhor. O périplo africano inicia por volta de 1412, com a tomada de Ceuta. A viagem de Vasco da Gama foi 1497 e a de Bartholomeu Dias em 1499. Ou seja, temos quase 1 século de conhecimento da África. Mas a colonização deu-se na África, mas sim na América.
erro
erro registros
Jubert se mudou para Bragança Paulista após ser processado em Atibaia
Data: 01/01/1910
(!)
Boletim de Joseph Jubert aos colonos
Data: 01/01/1912
Distribuição de boletim fez francês ser processado por fazendeiros locais sob acusação de "iludir a boa fé dos colonos" (@)(!)
Joseph Jubert preso e torturado
Data: 04/05/1913
Professor preso e torturado por querer educar trabalhadores (@)


Procurar



Hoje na História


Brasilbook.com.br
Desde 27/08/2017
28375 registros (15,54% da meta)
2243 personagens
1070 temas
640 cidades

Agradecemos as duvidas, criticas e sugestoes
Contato: (15) 99706.2000 Sorocaba/SP