cotidiano. E concertavam sobre os ofícios que compunham o seu viver: açougueiro,sapateiro, ferreiro, tecedeiras e tecelões, alfaiates, carpinteiros, azuladores, curadores,afiladores, estabelecendo posturas e regimentos Cada qual devia exercer seu ofício,observados os costumes e a tradição. As corporações de ofício representavam acompreensão “familiar” que se tinha da sociedade, complementando segundo suascompetências o que era necessário ao todo. Não se tratava de mero ofício: para alémdisso, se tratava da forma de participação na manutenção da sociedade hierárquica. Mas,alguma coisa devia estar acontecendo na Colônia, porquanto se requereu que os oficiais(da Câmara) mandassem que os oficiais ferreiros, carpinteiros, sapateiros e os maisofícios trabalhem e façam seus ofícios sob a pena de cinco cruzados ou venham adesistir de seus ofícios junto à Câmara (18.09.1587, p. 328). Talvez estivesse havendoocupações mais interessantes para estes oficiais mecânicos. Em 27.01.1590 se registra:aqui andavam alguns homens forasteiros e não faziam muito proveito à terra, comserem oficiais não queriam trabalhar ... que trabalhassem ou se fossem fora da vilaconforme ao regimento e leis do reino ... (383). A colônia ensejava a transformaçãosocial. A tradição se debatia com a realidade circundante. Eram essas pequenasexperiências que, lentamente, possibilitariam um novo modo próprio de ser.São Paulo foi, por certo, um posto avançado, para a entrada no sertão. Aexpressão então usada era campo.22 O sertão era a terra dos índios. O contato com oíndio, contato necessário e inevitável, fora, aliás, a razão dada por Nóbrega para afundação de uma casa no campo e, por isto, se fez desde a chegada, incrementando-secada vez mais. Os jesuítas não subiram sozinhos: foi a sociedade portuguesa queavançou a caminho do sertão, os mais diversos interesses interagindo na configuração davila. O sertão era a promessa de ouro e prata, isto é, de riqueza, a esperança darealização das expectativas de quem deixou o torrão natal buscando mais. O sertão era acondição das possibilidades de vida do paulista. São Paulo desde o início era aconvivência de portugueses, índios e mamelucos. Morar em São Paulo era viver osertão. [Página 23]
Essa parte inferior que era "coisa", porque escrava, ou que era tratada como bicho, como nós tratamos gente camponesa, a gente que está por baixo, a gente miserável, essa gente que estava por baixo, foi despossuída da capacidade de ver, de entender o mundo. Porque se criou uma cultura erudita dos sábios, e se passou a chamar cultura vulgar a cultura que há nessa massa de gente.
Data: 01/11/1977 Fonte: José Viana de Oliveira Paula entrevista Darcy Ribeiro (1922-1997)*