Cap. 2- Os profissionais da construção na São Paulo imperial (engenheiros e empreiteiros)
1997 Atualizado em 14/09/2025 20:09:20
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Cap. 2- Os profissionais da construção na São Paulo imperial (engenheiros e empreiteiros)By Eudes Camposvisibility162 Viewsdescription196 Pagesmesmo deveria ocorrer com as seções, cujos limites territoriais eram vistos agora comodemasiado extensos214. Nos últimos quinze anos da era imperial a capital paulista sofreu profundastransformações. Em estudo clássico, o professor Eurípedes Simões de Paula (1910-1977)considerou-as como tendo produzido a “segunda fundação de São Paulo”. A crescenteacumulação capitalista, propiciada pelo florescimento da economia do café, e os seusreflexos na cidade - o abrupto crescimento populacional e físico da urbe, a onda dereconstrução e expansão edilícia, a transferência de ricos fazendeiros, que aí passaram acontar com residências temporárias ou definitivas, a mudança da mentalidade das elites- ocasionaram a brusca ampliação das oportunidades de trabalho para os engenheiros. Apartir de então os empreendimentos da iniciativa privada, principalmente serviços denatureza urbana - transportes públicos, serviços de água, esgotos, luz, telefone, etc. -,não poderão absolutamente prescindir da cooperação técnica desses profissionais, emgeral de origem estrangeira: Henry Batson Joyner, 1839-1884 (Companhia Cantareira eEsgotos), Joseph Bryan (The S. Paulo Gaz Company e Companhia Cantareira e Esgotos),Fernando Dumoulin (Companhia União Telefônica do Brasil), Alberto Kuhlmann,1845-1905 (proprietário da Companhia Carros de Ferro S. Paulo a S. Amaro), etc.215. E no que se refere particularmente à arquitetura civil, temos notícia de quejá em 1873 o engenheiro militar Azevedo Marques havia sido solicitado a apresentar aplanta de um teatro para um grupo de capitalistas (Teatro Provisório Paulistano) e dirigirsua construção. O profissional fez o trabalho de graça, condição que, ao que tudo indica,se refletiu de modo negativo na obra acabada. Depois de concluída, o autor teve demandar abrir óculos no interior do edifício para facilitar o arejamento, atitude que nos fazdesconfiar de que os planos se tenham ressentido do fato de os trabalhos profissionaisnão terem sido remunerados. A precipitação na execução e o provável caráter elementardos planos devem ter provocado, sem dúvida, erros que tiveram de ser corrigidosposteriormente216. Esse mesmo engenheiro, cinco anos depois, forneceria planta para onovo Hospital da Misericórdia, que inicialmente deveria ser localizado num terreno dorecém-loteado Bairro da Bela Vista217. Por uma nota de jornal, sabemos também que um dos primeirosengenheiros-arquitetos a projetar na cidade para clientes particulares foi o alemãoHermann von Puttkammer (1842-1917), que montava em 1876 seu escritório “polymathico”, juntamente com um sócio de nome Carlos Arno-Gierth218, ocasião emque planejou e ergueu o primeiro hotel de luxo do Brasil para um rico negociante suíçoalemão radicado na Corte, de nome Frederico Glette (?-1886) 219(fig.22). No anoseguinte, solicitou à Câmara autorização para armar andaimes e depositar material nafrente da casa do Sr. Cincinato na Rua Alegre, sem dúvida o bacharel Augusto Cincinatode Almeida Lima, advogado e fazendeiro, ainda em 1873 morador em Araras220. Em 1878,Von Puttkammer anunciava um escritório “architectonico” na Capital, desta vezassociado a um engenheiro-arquiteto de origem itálica, D.C. Bianchi. Conforme apropaganda, recebiam encomendas de projetos e orçamentos de edifícios de todogênero; construíam inclusive terreiros de café:Escriptorio ArchitectonicoOs abaixo assignados abriram um escriptorio de architectura, e recebemencommendas para projetos e orçamentos de edificios de toda especie, comosejam: casas, palacetes, theatros, egrejas, etc.Executam plantas do gosto e conforme as instrucções de seus commitentes;encarregam-se de qualquer trabalho de construcção, concertos e reformas decasas, terreiros por empreitada, administração, ou por simples direcção, tantonesta cidade como no interior da provincia.Estão também habilitados a fornecer todos os materiaes de construcção porpreços rasoaveis, e a alugar operarios de edificios, a quem delles precisar.Para tratar no sobrado da fabrica de tecidos em S. Paulo. rua da Constituição,das 10 horas da manhã até as 4 da tarde.V. PuttkammerD.C. BianchiEngenheiros architectos221 O anúncio da abertura do escritório de arquitetura não deixou de ser bemrecebido pela imprensa paulistana, dada a raridade desse tipo de iniciativa. O jornal AProvincia de São Paulo (11 de abril de 1878, p. 2), por exemplo, saudou-o do seguintemodo: [p. 93, 94]
Acesso em 1º de outubro de 2009. 208-MOURA, Carlos E.M. de. O negro na formação cultural do Brasil: tentativa de nominata eiconografia. In: ARAÚJO, E. (org.). A mão afro-brasileira. São Paulo: Tenenge, 1988. p.373. 209-Ver nota n. 207. 210-Ver a esse respeito, por exemplo:SÃO PAULO (Cidade). DPH (SMC). Adequação da ordem. São Paulo: 1992 (trabalho nãopublicado). p.149 e ss. 211- RELATORIO, 4 de setembro de 1884. p.44. 212- RELATORIO, 10 de janeiro de 1885. p.102. 213- RELATORIO, 2 de setembro de 1885. p.33. 214- ANNEXO n.6 [Relatorio da Repartição de Obras Publicas], 20 de novembro de 1886. p.5. In:RELATORIO, 17 de janeiro de 1887. 215-ALMANACH da provincia de S. Paulo para o anno de bissexto de 1884. 2º anno. São Paulo: JorgeSeckler, 1883. p.247.LUNÉ e FONSECA, op.cit., p.110.RAFFARD. op. cit.,. p.25.MARTINS, op.cit., p.108.E na Diretoria Geral de Obras Públicas, a partir de 1886, encontrava-se fazendo parte do corpotécnico o engenheiro italiano Luís Bianchi Betoldi. Cf.:RELATORIO, 26 de abril de 1886, p.8.A respeito desse engenheiro, ver:SALMONI, Anita e DEBENEDETTI, Emma. Arquitetura italiana em São Paulo. São Paulo:Perspectiva, 1981. p.55. 216- THEATRO provisorio. Correio Paulistano. São Paulo, 1º de agosto de 1876. p.2. 217- MESGRAVIS. A Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. p.140. 218- ENGENHEIROS. A Provincia de S. Paulo. São Paulo, 12 de janeiro de 1876, p. 2.GRANDE Hotel. Correio Paulistano. São Paulo, 1º de agosto de 1876, p.2. Nessa última fonte o nome do sócio de Von Puttkammer aparece estropiado: C. Gurtti.Recentemente encontramos notícias sobre esse profissional, trabalhando no Rio de Janeiro entre1890 e 1905. Em 1890 pretendia construir uma ferrovia circular eletrificada nessa cidade. Em1905, erguia uma nova sede para a loja Torre Eiffel na recém-aberta Avenida Central.
Em entrevista telefônica concedida ao autor deste estudo em abril de 1993, D. Helena von Puttkammer Xavier da Silveira, neta do engenheiro Hermann von Puttkammer, revelou o pouco que lembra ter ouvido sobre o engenheiro, de sua avó, Agnes von Puttkammer. Foi estudante deescola militar e veio para o Brasil fugido de seu país por razões mal esclarecidas. Sua avó relatava, entretanto, que Puttkammer apresentava marcas pelo corpo, motivadas talvez “por algum castigo recebido por ter tomado parte num levante de estudantes”.
Pelo que afirmou Sérgio Coelho num artigo escrito para O Estado de São Paulo, e publicado em 1970, chegou aqui em 1865 acompanhando um amigo seu, Luís Mateus Maylasky, húngaro, que por sua vez imigrou quase banido “após bater-se em duelo fatal com um nobre da côrte”, o que nos faz supor que ambos tenham deixado a Europa por uma razão comum, envolvendo política e violência. Por terem sido recomendados ao superior da Ordem de São Bento, dirigiram-se à Sorocaba, onde esse monge estava residindo. Originário de uma antiga família aristocrática pomerana, em que há um ramo detentor do título de conde e outro do de barão, Puttkammer tinha uma parente casada com Príncipe de Bismarck (1815-1898). Uma prima sua, Johanna (1824-1894), irmã do homem de estado Robert Viktor von Puttkamer (1828-1900), ministro da Instrução Pública da Prússia (1879). Segundo a neta, Hermann falava sete línguas, entre elas russo, inglês e francês.
Trouxe com ele para o Brasil quatro filhos do seu primeiro casamento: Carlos, Luís (?-1963), Jorge e Carlota (?-1950). Aqui se casou novamente com Agnes, de Berlim, que lhe deu mais doisfilhos, um dos quais Wolfgang, pai de D. Helena. Os filhos do primeiro casamento não se davam com os meios-irmãos, pois “tinham o nariz empinado”. De sua vida profissional pouco se sabe:
com Maylasky, construiu a estrada de ferro Sorocabana, entre 1870 e 1875, e seu prolongamento, em 1899; projetou para um negociante suíço-alemão estabelecido na Corte, Frederico Glette, o Grande Hotel, de São Paulo (1876-1878); para esse mesmo cliente arruou os Campos Elísios(1879); pertenceu ao corpo técnico da ferrovia Rio-Clarense; em 1892 era vereador em São Carlos do Pinhal e finalizou a construção do palacete de Elias Chaves (1893-1899), nos Campos Elísios.Faleceu em Ribeirão Preto em 1917.
Além do depoimento de D. Helena, redigimos esta nota baseando-nos em dados constantes do arquivo do Instituto Martius-Staden, nas biografias de Robert von Puttkammer e de sua irmã encontradas na web e em outros documentos: ROBERT von Puttkamer. Wikipedia, the free encyclopedia Disponível em:< http://en.wikipedia.org/wiki/Robert_von_Puttkamer> JOHANNA von Puttkamer. Wikipedia, the free encyclopedia Disponível em:< http://en.wikipedia.org/wiki/Johanna_von_Puttkamer> Acesso em 10 de abril de 2011. COELHO, Sérgio. Recusa fez surgir Sorocaba. O Estado de São Paulo. São Paulo, 29 de agosto de1970. p.16.SÃO PAULO (Estado). SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA. CONDEPHAAT. CAMPOSELÍSEOS, história e patrimônio. São Paulo: 1982. (Projeto Áreas Envoltórias).
219-SÃO PAULO (Cidade). INSTITUTO MARTIUS-STADEN (antigo INSTITUTO HANS STADEN).SOMMER, Friedrich. Die Deutschen in São Paulo. São Paulo:1945. V.3,P.1.p.304.(manuscrito). Vertambém necrológio do engenheiro no Correio Paulistano de 9 de dezembro de 1917,p.3. 220-SÃO PAULO (Cidade). DEPARTAMENTO DO ARQUIVO HISTÓRICO DE SÃO PAULO. ObrasParticulares-Papéis Avulsos. V.E-1-3. Solicitação de autorização para armar andaimes na frenteda casa do Dr. Cincinato. São Paulo, 30 de agosto de 1877. (ass) Hermann von Puttkammer.221 - ESCRIPTORIO architectonico. Correio Paulistano. São Paulo, 10 de abril de 1878. p.4.Não deixa de ser extremamente revelador do rápido florescimento da iniciativa privadapaulistana dos últimos anos de 1870 o anúncio da Imperial Litografia de Jules Martin publicado noCorreio Paulistano (25 de maio de 1878. p.4), em que se declarava que a oficina estava emcondições de prontificar quaisquer encomendas, entre elas, “vistas de hoteis, fabricas, etc.”.Possivelmente Martin realizava vistas arquitetônicas também por solicitação de projetistas. Sãoconhecidas, por exemplo, a vista do palácio do governo (c.1885) na sua segunda versão, compórtico, não completamente realizada (de autoria de Eusébio Stevaux), e a do Hospital dosVariolosos (1879-81), de autoria do engenheiro Gama Cochrane.Em sua oficina ficaram expostos ainda os projetos de Peyrouton para a construtora da Olaria doBom Retiro, ao que parece, litografados (Correio Paulistano, 7 de fevereiro de 1878. p.3). 222-TERRENOS. Correio Paulistano. São Paulo, 27 de fevereiro de 1878. p.3. Pesquisas recentes afirmam que Charles Peyrouton trabalhou na obra do Palácio dos Condes deNova Friburgo, no Rio de Janeiro, atual Palácio do Catete. É, porém, mais conhecido como autordo belo solar dos Barões de Itapeva em Pindamonhangaba (até alguns anos atrás sede da Capítulo 2- 129prefeitura da cidade), construção datada por volt [p. 128, 129]
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