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Carta dos oficiais da Câmara da vila de São Paulo, dirigida ao donatário da capitania Lopo de Souza 13/01/1606 3 fontes 1° fonte: Correio Paulistano Antiguidades paulistanas - Carta dos oficiais da Câmara da vila de São Paulo, dirigida ao donatário da capitania Lopo de Souza
Com o capitão João Pereira de Souza, que Deus levou, recebemos nesta câmara uma carta de V.mercê o ano passado, na qual nos manda que lhe escrevamos miudamente tudo o que parecer. Alguns treslados de cartas se acham aqui das que escrevemos a Vme; nos parece que não lhe foram dadas.
O que de presente se poderá avisar, muito papel e tempo seria necessário, porque são tão várias e de tanta altura as coisas que diariamente sucedem, que não falta matéria de escrever e avisar e se, poderá dizer, de chorar. Só fazemos lembrança a Vme. que se sua pessoa, ou coisa muito sua, desta Capitania, não acudir com brevidade pode entender que não terá cá nada, pois estão as coisas desta terra com a "candeia na mão" e cedo se despovoará, porque assim os Capitães e Ouvidores que Vme. manda, como os que cada quinze dias nos "mettem" os governadores gerais, em outra coisa não entendem, nem estudam, senão como nos hão de esfolar, destruir e afrontar, e nisto gastam o seu tempo; eles não vem nos governar e reger, nem aumentar a terra que o sr. Martim Afonso de Souza ganhou de S.M. lhe deu com tão avantajadas mercês e favores.
Vai isto em tal estado que "pelo eclesiástico e secular não há outra coisa senão pedir e apanhar, e um que nos pedem e outro que nos tomam tudo é seu e ainda lhe ficamos devendo." E se falamos prendem-nos e excomungam-nos e fazem de nos o que querem, que como somos pobres e temos o remédio tão longe, não há outro recurso senão abaixar a cerviz e sofrer o mal que nos põem.
Assim senhor, acuda veja, ordene e mande o que lhe parecer, que muito tem a terra que dar; é grande, fértil de mantimentos, muitas águas e lenhas, grandes campos e pastos, tem ouro, muito ferro e açúcar, e esperamos que haja prata pelos muitos indícios que há, mas faltam mineiros e fundidores destros.
E o bom governo é que nos falta de pessoas "que tenham consciência e temor de Deus e valia" que nos mandem o que for justo, e nos favoreçam no bem e castiguem no mal quando merecemos, que tudo é necessário.
Diogo de Quadros é ainda provedor das minas, até agora tem procedido bem, anda fazendo um engenho de ferro a três léguas desta vila e como se perdeu no Cabo Frio trem pouca posse e vai devagar, mas acabal-o-ha, e será de muita importância por estar perto daqui como três léguas, e haver metal de ferro; mais há na serra de - Byracoiaba - 25 léguas daqui para o sertão, em terra mais larga e abastada e perto dalí como três léguas está a - Cahatyba - d´onde se tirou o primeiro ouro, e desde ali ao Norte haverá 60 léguas de cordilheira de terra alta que toda leva ouro, principalmente a serra de - Jaraguá - de N. Senhora de Monte Serrate, a de Vuturuna - e outras.
Póde v. mc. fazer aqui um grande reino à S. M. há grande meneio e trado para Angola, Perú e outras partes, podem-se fazer muitos navios, que só a bem se pode trazer de lá, pois já muito algodão, muitas madeiras e outros achegos.
Quanto a consideração do gentio que não convêm termos (ou lermos?) e avexarem-nos, assim como nos fazem a nós o fazemos a eles, e os cristão vizinhos são quase acabados; mas no sertão há infinidade deles, e de muitas nações, que vivem a lei dos brutos animais, comendo-se uns aos outros, que se os descermos com ordem para serem cristãos será coisa de grande proveito, principalmente o gentio - carijó - que está 80 léguas daqui por mar e por terra, e se afirma que podem ser 200.000 homens de arco. Esta é uma grande empresa e a v. mc., ou coisa muito sua, e estava bem que S.M. lhe concedesse e lhe importaria mais de 1000:000 cruzados, afora o de seus vasalos, o que pelo tempo adiante pode redundar a esta capitania, além do particular do mesmo gentio vindo ao grêmio da Santa Madre Igreja.
Tornamos a lembrar: acuda v. mc. porque de Pernambuco e da Bahia, por mar e por terra, lhe levou o gentio de seu sertão e distrito, e muito cedo ficará tudo ermo, com as árvores e erva do campo somente.
Não tem cá v. m. tão pouca posse, que das cinco vilas quje cá tem, com a Cananéa, pode por em campo para os - carijós - mais de 300 homens portugueses afora os seus índios escravos, que serão mais de 1.500, gente usada ao trabalho do sertão, que com bom caudilho passam do Perú por terra, e isto não é fábula.
Já v. mc. seria sabedor como Roque Barreto, sendo capitão, mandou ao sertão 300 homens brancos a descer gentio e gastou dois anos na viagem com muitos gastos e mortes por ser contra uma lei de el-Rei, que os padres da companhia trouxeram, o governador-geral Diogo Botelho mandou provisão para tomarem o terço para ele, e depois veio ordem para o quinto; sobre isto houve aqui muito trabalho e grandes devassas e ficaram muitos homens encravados, que talvez ha nesta vila hoje mais de 65 homiziados, não tendo ela mais de 190 moradores; se lá for alguma informação de que a gente desta terra é indômita, creia v. mc. o que lhe parecer com o resguardo que deve aos seus, que não ha quem sofra tantos desaforos.
Nosso Senhor guarde a pessoa e a família de v. mc. por muitos anos como a todos é mister. Vila de São Paulo em câmara 13 de janeiro de 1606. - Diogo Dias - Clemente Alvares - José de Camargo - Manoel Fernandes - Belchior da Costa.
2° fonte: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, volumes 20-21 CARTA AO DONATÁRIO DA CAPITANIA
Com o capitão João Pereira de Souza, que Deus levou, recebemos nesta câmara uma carta de V.mercê o ano passado, na qual nos manda que lhe escrevamos miudamente tudo o que parecer. Alguns treslados de cartas se acham aqui das que escrevemos a Vme; nos parece que não lhe foram dadas.
O que de presente se poderá avisar, muito papel e tempo seria necessário, porque são tão várias e de tanta altura as coisas que diariamente sucedem, que não falta matéria de escrever e avisar e se, poderá dizer, de chorar. Só fazemos lembrança a Vme. que se sua pessoa, ou coisa muito sua, desta Capitania, não acudir com brevidade pode entender que não terá cá nada, pois estão as coisas desta terra com a "candeia na mão" e cedo se despovoará, porque assim os Capitães e Ouvidores que Vme. manda, como os que cada quinze dias nos "mettem" os governadores gerais, em outra coisa não entendem, nem estudam, senão como nos hão de esfolar, destruir e afrontar, e nisto gastam o seu tempo.
Eles não vêm nos governar e reger, nem aumentar a terra que o sr. Martim Afonso de Souza ganhou, e S. Magestade deu com tão avantajadas mercês e favores. Vai isto com tal maneira e razão, que pelo eclesiastico e pelo secular, não ha outra coisa senão pedir e apanhar; e um que nos pedem e outro que nos tomam, tudo é seu e, ainda lhes fiamos devedor.
E, se falamos, prendem e excomunam-nos, e fazem de nós o que querem, que como somos pobres e temos remédio tão longe, não há outro rccurso senão baixar e servir e sofrer o mal que nos põem.
Assim, Senhor, acuda, veja, ordene e mande o que lhe parecer, que muito tem a terra que dar: é grande, fértil de mantimentos, muitas águas e lenhos, grandes campos e pastos, tem ouro, muito ferro e açuar e esperamos que haja prata pelos muitos indicios que há, mas faltas mineiros e fundidores destros.
E o bom governo é o que nos falta, de pessoa que tenha consciência e temor de Deus, e valia; que nos mandem o que for justo e nos favoreçam no bem e castiguem o mal quando o merecermos, que tudo é necessário.
Diogo de Quadros é ainda provedor das minas; até agora tem progredido bem: anda fazendo um engenho de ferro a três léguas desta vila, e como se perdeu no Cabo Frio, tem pouca posse e vai devagar, mas acabado, será de muita grande importância por estar perto daqui com três léguas, e haverá metal de ferro; mas há na serra de Byraçoiaba 25 léguas daqui para o sertão, em terra mais larga, e abasta, e perto dali com três léguas está a Cahatyba de onde se tirou o primeiro ouro, e desde ali ao Norte gaverá 60 léguas de cordilheira de terra alta, que toda leva ouro, principalmente a serra de Jaraguá, de Nossa Senhora do Monte Serrate, a de Voturuna, e outros.
Pode Vmc. fazer aqui um grande reino a S.M,; há grande menero e trato para Angola, Perú e outras partes, podem-se fazer muitos navios que só o bem se pode trazer de lá, pois ha muito algodão, muitas madeiras e outros achegos.
Quanto a conservação dos nativos que não convém termos a vexar-nos, assim como nos fazem a nós o faremos a ele, e os cristãos vizinhos são quase acabados, mas no sertão ha infinidade deles e muitas nações, que vivem a lei de brutos animais, comendo-se uns aos outros, que se os descermos, com ordem para serem cristãos será coisa de grande proveito; principalmente os nativos Carijós, que estão a oitenta léguas daqui por mar e por terra e se afirma que são 200.000 homens de arco. Esta é uma grande empresa e Vmc. ou coisa muito sua lhe está bem que S.M. lh concedesse, e lhe importaria de 100.000 cruzados, afora os de seus vaçalos, o que pelo tempo adiante pode abundar nesta Capitania, além do particular do mesmo nativo vindo ao gremio da Santa Madre Igreja.
Tornamos a lembrar, acuda Vmc. porque de Pernambuco e da Bahia, por mar e por terra, lhe levam os nativos do sertão e distrito, e muito cedo ficará tudo ermo com as árvores e as ervas do campo somente; porque os portugueses, bem sabe Vmc. que são homens de pouco trabalho, principalmente fora do seu natural.
Não tem Vmc. cá tão pouca posse, que das cinco vilas que cá tem, com a Cananéa, pode por em campo para os Carijós mais de 300 homens portugueses, foram os seus nativos escravizados, que são mais de 1.500, gente usada ao trabalho do sertão, que com bom caudilho passam ao Perú por terra, e isto não é fábula.
Já Vmc. será sabedor como Roque Barreto, sendo capitão, mandou ao sertão 300 homens brancos a descer os nativos e gastou dois anos na viagem, com muitos gastos e mortes, e por ser contra uma lei de El-Rey que os padres da Companhia trouxeram, o governador Diogo Botelho mandou provisão para tomarem o terço para ele, e depois veio a ordem para o quinto.
Sobre isso houve aqui muito trabalho e grandes devassas e ficaram muitos homens encravados, que talvez ha nesta vila hoje mais de 65 homiziados, não tendo ela mais de 190 moradores. Se lá for alguma informação de que a gente desta terra é indômita, creia Vmc. o que lhe parecer, com o resguardo que deve aos seus, que há quem sofra tantos desaforos. [Páginas 731 e 732]
3° fonte: Registro Geral da Câmara Municipal de São Paulo, vol. VII, 1919 (...) da vila e haver muito metal de ferro mais ha na serra de Biraçoiaba 25 léguas daqui para o sertão em terra mais larga e abastada e perto dali como três léguas está a Cahatiba de onde se tirou o primeiro ouro e desde ali ao norte haverá sessenta léguas de cordilheira de terras que todas levam ouro principalmente a serra de Jaraguá de Nossa Senhora do Monserrate e a de Voturuna e outras.
Pode vossa mercê fazer aqui um grande reino a Sua Majestade / há grande meneio (ato ou efeito de menear(-se); balanço, oscilação. 2. movimento do corpo ou de uma de suas partes.) e trato para Angola, Perú e outras partes (...) [Página 112]
Nosso Senhor guarde a vossa mercê e sua família e casa da sua Câmara da vila de São Paulo capitania ide São Vicente 13 de janeiro, Belchior da Costa escrivão o fez no ano 1606. E não há mais humilde e obediente que nós neste estado conforme ao que sofremos. [Pgina 114]
Provisão 20/08/1606 1 fontes 1° fonte: “São Paulo na órbita do Império dos Felipes: Conexões Castelhanas de uma vila da américa portuguesa durante a União Ibérica (1580-1640)” de José Carlos Vilardaga Em relação às minas existentes, além da mina do Jaraguá, de Afonso Sardinha, e que, segundo Taunay, enriquecera também Braz Esteves Leme, e Vuturuna, próxima a Santana de Parnaíba, existiam as chamadas “minas do Geraldo”, no caminho para o morro do Jaraguá.
Estas minas são comprovadas numa carta apócrifa, e sem data, inserida na publicação do Livro Segundo do Governo do Brasil. Provavelmente direcionada a Francisco de Souza, o sujeito relatava, nesta carta, que, depois de quase ter sido preso por tentar averiguar os quintos na casa de fundição da vila, acabou sendo levado por Simão Alvares para ver amostras de ouro trazidas por Clemente Alvares, que havia descoberto e fundido um ouro “mui finíssimo e limpo” e que, segundo “Claudio” (talvez o ourives Claudio Furquim), tinha vantagem “do de Seraldo”, na verdade Geraldo Correia Sardinha.
Sabe-se que, natural de São Paulo, Clemente Alvares era homem empenhado e dedicado aos metais. Parceiro de Afonso Sardinha, o moço, durante suas empreitadas de pesquisa de minas, casou-se com a filha do castelhano Martim Rodrigues Tenório, um dos envolvidos no erguimento do engenho de ferro em Santo Amaro.
Tornou-se, assim, cunhado do engenheiro flamengo Cornélio de Arzão, também envolvido, a partir de 1609, com a produção de ferro. Em 1600, ficou como guardião de certo metal que parecia prata, e foi responsável por fazer os testes adequados.
As Atas da Câmara denunciam sua presença no sertão, com sua tenda de ferreiro, resgatando com os índios em pelo menos duas ocasiões. Em 1606 – estimada data da carta apócrifa - Clemente compareceu à Câmara de São Paulo para registrar algumas minas que tinha descoberto e, desse modo, não perder os direitos sobre elas, observando o que determinava o novo Regimento das Minas de São Paulo.
É provavelmente deste ouro que nosso missivista em questão falava. Portanto, as notícias concretas destas riquezas minerais são mesmo esparsas e fragmentárias, mas ainda assim sugestivas.
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