No último quartel do século passado, deram os habitantes de Sorocaba de buscar minas de ouro para os lados da Serra do Mar, de cujo cimo divisavam em longínquo horizonte, monte altíssimo, coroado de nuvens. Os roteiros do tempo davam-lhe sete a oito léguas de comprido e o qualificavam disformemente alto. Tal era o lendário Botucavarú, descoberto por João Batista Victoriano, em 1780. [Páginas 127 e 128]
CABARÚ-PARARANGA O relincho ou nitrido do cavalo. São Paulo. [“O Tupi na Geographia Nacional”, 1901. Teodoro Fernandes Sampaio (1855-1937). Página 210]
CAVARÚ-PARARANGA s. O relincho do cavalo. São Paulo.
"Da mesma procedência é o nome Botucavaru (lbytú-cabarú)que quer dizer cavalo das nuvens, aplicado a uma montanha alta sobre a qual as nuvens constantemente pousam ou ficam a cavaleiro. A idéia de cavalo-(cabarú) os nativos não a tiveram senão depois da invasão européia.
"O nome Tupã teve, decerto, dois ou mais sentidos, desde o tupiprimitivo até a língua geral, esta já profundamente influenciada pela cultura européia. Tupã, no tupi primitivo, genuinamente indígena, é tuh-ã,o que fica alto ou erguido, o que está no alto; e assim, tupã-beraba é oque está no alto reluzindo, o relâmpago; tupã-cynynga, o que está noalto roncando, o trovão. Na língua geral, já influenciada pelo missionário,pela religião nova, Tupã (de tub = o que fica, permanece ou reside; ã =alto, erguido), por uma extensão naturalíssima do significado, vai até exprimir: o que domina, o que fica superior, Deus, o Altfssimo. O missionário
Ficaram de todos os ciclos das descobertas, interessante documentos, alguns verídicos, como este que vai transcrito, encontrado entre os papéis despachados pelo capitão general, Martim Lopes Lobo de Saldanha, apenso a um requerimento solucionado em 21 de janeiro de 1782. Dizia:
ARANZEL OU ROTEL DE HAVER OURO E PEDRAS PRECIOSAS NOS CAMPOS ENTRE O SUL E O LESTE
Entrando nos ditos campos entre o Sul e o Leste rumo direito passaram dois ribeirões, e o depois passaram duas Serras; darão em um Ribeirão em cima meio descalvado, ou com bastante pedras. Em dois Córregos que emanam da Serra e fazem Barra no dito Ribeirão tem ouro com abundância. Subindo a Serra dobrando para trás tem outro ribeirão mais pequeno, como uma Cachoeira: pelo barranco acima da Cachoeira tiraram o ouro em pedaços. Irão para adiante, pendendo para o sul alguma coisa; subindo e descendo algumas Serras, não mui alcantiladas, darão com um vargedo grande que atola tem quatro ou cinco palmos de Lodo, abaixo tem um bom cascalho, e tem grandiosa pinta. Irão adiante e darão com uma Lagoa Grande na veira desta Lagoa fez-se um socavão, tirou-se ouro em pedaços, e muitas pedras que não soubemos conhece-las de várias cores e pareciam serem preciosas todas. Isto de Sorocaba picando o mato, serão oito ou dez dias. Por estar para morrer e já não ter esperanças de vida, faço este aranzel deixando para os viventes; muitos anos não quis declarar estes haveres; e quem achar com este meu Roteiro Os haveres ditos, peço me mande dizer quarenta missas outras quarenta pelas mais necessitadas almas. [Páginas 87 e 88]
Os documentos mais antigos que fazem referência ao Morro de Araçoiaba e à Lagoa Dourada são as cartas do padre jesuíta José de Anchieta, indicando que o local ficava em uma montanha a oeste de São Paulo, e que muitas pessoas chamavam de Uvutucavarú (morro aurífero, assemelhando-se a um cavalo). Possivelmente seguindo essas informações de Anchieta e a lenda dos tupiniquins de que haveria enorme tesouro em ouro na Lagoa Dourada, os sertanistas Afonso Sardinha (pai e filho) e seus companheiros foram atraídos até o morro do Araçoiaba, nas proximidades do ano de 1587. [Página 18]
João Baptista Victoriano, um sertanista, escreveu uma Representação ao Governador Martim Lopes Lobo de Saldanha, em 1782, reclamando de um alferes que lhe estorvava a empresa do novo descoberto do Morro Ivutucavarú, na capitania de São Paulo. Com violência, este alferes expulsou todos os seus companheiros, alegando ser ele o verdadeiro descobridor.
Victoriano, como um bom paulista súdito do rei português, escreveu uma extensa Representação ao governador, narrando todos os perigos e riscos de vida que ele e seus camaradas enfrentaram para alcançar o dito morro. Junto a este escrito público foi anexada um aranzel, uma espécie de instruções de caminho para se alcançar umas lavras de ouro.
O aranzel anexo terminava com as fúnebres palavras de seu autor: "por estar para morrer eja não ter esperanças de vida fasso este aranzel deixando para os viventes: muitos anos não quis declarar estes haveres; e quem achar com este meu Roteiro os haveres ditos, pesso me mande dizer quarenta missas outras quarenta pelas mais necessitadas almas" (DIHCSP, v. 3, pp. 57-58)
Ainda no mesmo escrito público seguia uma oração, uma "Benssam do ar": "ar vivo, ar morto, ar de estupor, ar de perlezia, ar carregado, ar excomungado, eu te arenego, em nome da Sanctissima Trindade que sayas do corpo desta criatura ou animal e que vas parar no mar para que viva sam e aliviado".
Estes eram papéis comuns, escritos nas derradeiras horas de vida de sertanistas esperançosos do reconhecimento régio. O interessante é que serviam para uma maneira de dar maior autenticidade ao que se representava ou peticionava nos documentos burocráticos. Embora o caráter da Coleção dos Documentos Interessantes seja predominantemente administrativo, escritos como estes revelam muito do lado humano desta gente que em nome do rei vivia atarefada em serviços de abrir caminhos, fazer comércio, domar índios, expulsar espanhóis, mesmo que para isto colocassem em risco suas próprias vidas.