Bem antes de 1950, já se falava na televisão no Brasil. Em novembro de 1932, o presidente da Echophone Company Export, o americano A. H. Keleher, de passagem pelo Rio de Janeiro, vindo de navio de Buenos Aires, com destino a Nova York, explicava a existência nos Estados Unidos de 24 estações de televisão em caráter experimental, alem das de Montreal, no Canadá, Londres, na Inglaterra, e de duas na Alemanha.
Ainda ressaltou da transmissão da famosa corrida anual do Derby, na Inglaterra, cuja imagem, segundo ele, teria "aparecido com uma precisão perfeita de detalhes, como uma tela de cinema".
Ao final de sua entrevista afirmou: "Espero também proporcionar (a tecnologia) ao Brasil, isto é, à população do Rio de Janeiro, dentro de poucos meses".
Anos depois, em janeiro de 1934, o jornal carioca A Noite indagava: "Quando teremos a televisão no Brasil?", e publicava uma matéria sobre desenvolvimento da televisão na Alemanha, citando o trabalho do engenheiro Schlesinger, que estava construindo um aparelho de televisão com preço ao alcance de todos.
Sobre o assunto foram entrevistar o pai do rádio brasileiro, professor Edgard Roquette Pinto, então presidente da Confederação Brasileira de Rádiodifusão, que vinha realizando experiências com o intuito de introduzir a televisão no Brasil, e lembrou que a rádio Sociedade do Rio de Janeiro, da qual era fundador e seu presidente, no ano anterior, ao comemorar seus dez anos, fez a transmissão de algumas figuras e letras pela sua estação Marconi, em ondas de 400 metros.
Os alemães estavam com seus estudos mais avançados em matéria de televisão do que o resto do mundo, tanto que conseguiram a façanha, em 1935, de instalar a bordo do vapor Carthia um aparelho de televisão, que exibiu com a máxima nitidez imagens transmitidas da cidade de Hamburgo, apesar de a embarcação estar na ocasião navegando a grande velocidade nas águas do rio Elba.
No Brasil, a curiosidade sobre a televisão era enorme, e em 14 de novembro de 1936, o jornal Folha da Tarde de Porto Alegre publicou com grande destaque uma manchete em sua seção "Rádio" informando: "no próximo ano teremos televisão em Porto Alegre".
A reportagem contou com entrevista de Jose Gonçalves da Silva, da Rádio Difusora da capital gaúcha, que explicou que o vice-presidente da Companhia Philco estava inspecionando as emissoras da America do Sul em nome da Philco Television, e que a Difusora estaria preparada para a empreitada em 1937.
Gonçalves lembrou que os seus ouvintes, de posse dos seus aparelhos de televisão, poderiam assistir o movimento dos estúdios e até acompanhar as jogadas dos grandes "matches" de "foot-ball".
Em maio de 1939, chegava ao Rio de Janeiro Hans Pressler, diretor dos Correios do Reich, que vinha de Buenos Aires, onde representou a Alemanha no Congresso Postal Universal.
Pressler estava designado pelo Instituto de Investigações dos Correios e pelo Ministério dos Correios e Telégrafos de seu país para realizar demonstrações de televisão, sendo que durante o Congresso Postal na capital Argentina os participantes do evento puderam assistir o novo meio de comunicação.
Em entendimentos com o diretor do Departamento Nacional de Propaganda (DNP), Lourival Fontes, e com o diretor dos Correios e Telégrafos, ficou acertado que seria realizada também na capital brasileira a demonstração da aparelhagem e dos serviços de televisão.
O diretor dos correios alemão afirmou que faria instalar no Rio de Janeiro receptores de televisão, de diversos tipos, que fariam transmissões de cenas diretas, cenas tomadas ao ar livre, bem como exibiram trechos de filmes cinematográficos.
O outro equipamento que seria mostrado seria a visiotelefonia, equivalente à webcam dos nossos dias.
Na sexta feira 2 de junho de 1939, foi realizada pela primeira vez no Brasil uma exibição pratica da televisão, sendo os equipamentos montados em dois pavilhões da Feira de Amostras. Lourival Fontes foi o primeiro aparecer na tela, proferindo algumas palavras.
Os presentes puderam verificar a perfeita a transmissão da voz e da imagem através do complexo aparelhamento da A.G. Telefunken. Os técnicos da empresa alemã informaram aos jornalistas que aquele equipamento tinha alcance de 70 quilômetros.
No dia seguinte, foi realizado uma nova demonstração que contou com a presença do presidente da República, Getúlio Vargas, do ministro da Justiça e Negócios Interiores, Francisco Campos, e do ministro de Viação e Obras Públicas, general João de Mendonça Lima, do chefe da Casa Militar, general Francisco José Pinto, do diretor do DNP, Lourival Fontes, e de várias autoridades e artistas convidados.
Vargas fez questão de conhecer detalhadamente toda a parte técnica, que foi explicada primeiramente através de quadros esquemáticos, cujos desenhos demonstravam claramente o principio fundamental da televisão e da visiotelefonia.
O presidente, em seguida, examinou toda a aparelhagem do conjunto transmissor, quando, na sua presença, foi ligada para exibir a atuação da Dupla Preto e Branco, integrada por Herivelto Martins e Nilo Chagas, com a participação de Dalva de Oliveira.
Depois, Vargas foi conhecer os aparelhos receptores, que no momento transmitiam as Irmãs Pagãs, Elvira e Rosina, que cantavam um samba de seu repertório acompanhadas pelo conjunto regional do flautista Benedito Lacerda.
A seguir apareceu na tela o cantor Francisco Alves e novamente a Dupla Preto e Branco com Dalva de Oliveira, que interpretou o batuque Itaquari, de autoria do compositor Príncipe Pretinho.
Getulio Vargas, após os números musicais, fez questão de conhecer também as instalações de visiotelefonia. Após as explicações a respeito dessa modalidade de comunicação, resolveu fazer uma experiência pessoal, e entrou em uma das cabines enquanto em outra, mais distante, se instalou o ministro Francisco Campos.
Em seguida, os televisores reproduziram as imagens dos dois em animada e sorridente palestra para uma numerosa plateia, que do lado de fora assistia curiosa. Vargas, ao sair da cabine, mostrou-se bem impressionando com a interessante experiência.
Ao término da visita, todos assistiram pelos aparelhos de televisão a um filme produzido pelo Departamento Nacional de Propaganda sobre a Exposição do Estado Novo, realizada no inicio do ano.
Com a Segunda Guerra Mundial, que durou de 1939 a 1945, não houve mais experiências com a televisão no Brasil, que somente foram retomadas em 1948.*Antônio Sérgio Ribeiro, é advogado, pesquisador e diretor do Departamento de Documentação e Informação da Assembleia.