' José Viana de Oliveira Paula entrevista Darcy Ribeiro (1922-1997)* - 01/11/1977 de ( registros) Wildcard SSL Certificates
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José Viana de Oliveira Paula entrevista Darcy Ribeiro (1922-1997)
novembro de 1977. Há 47 anos
(atualmente) em muitas tribos o cachorro chegou antes do homem branco, o instrumento de ferro também, que é uma preciosidade incrível, passando de tribo para tribo, chegou. Muitas tribos foram procurar contato com os brancos como os "donos do ferro", a gente que tinha essa "super pedra", prodigiosa, duradoura e fantástica, que é o ferro, a que para o nativo é uma surpresa formidável.

(...) a conquista das Américas pelo europeu foi feita sobretudo pelas pestes europeias, pelas enfermidades que eles traziam. O mundo africano, asiático e europeu, era um mundo só de contágio e todas as pestes andavam por ali. Tuberculose, sífilis, gonorreia, uma quantidade enorme de doenças circulavam por ali.

A redução da população nativa americana por efeito das doenças e da escravização inicial foi de fator 25, ou seja, onde existiam 25 pessoas, depois de 1 século ficou apenas uma. E essa é proporção que também ocorre no Brasil, quer dizer, uma depopulação tremenda, porque, gente que não conhecia nem cárie dentária, no momento em que encontra com a civilização, é o apodrecimento dela. O nativo, depois de um século, é um mulambo de gente.

Antes de mostrar como a civilização chegara a apodrecer, é importante demonstrar o que é a "indianidade" original. Para mim, a "indianidade" original é uma condição humana que se preservou no Brasil por acaso. Eles estão na raiz da espécie humana em relação á nós, como estão em relação aos chineses ou os franceses.

Eles são do humano, aquele humano antes da estratificação da humanidade e também o passo mais importante da evolução humana, foi o surgimento da sociedade de classe. Desde esse momento, o humano se apodreceu tremendamente. No começo uma parte da humanidade, depois a maior parte da humanidade passou a poder ser tratada como escravo, ou seja, como coisa, e desumanizada.

00:07 - Essa parte inferior que era "coisa", porque escrava, ou que era tratada como bicho, como nós tratamos gente camponesa, a gente que está por baixo, a gente miserável, essa gente que estava por baixo, foi despossuída da capacidade de ver, de entender o mundo. Porque se criou uma cultura erudita dos sábios, e se passou a chamar cultura vulgar a cultura que há nessa massa de gente.

Então qualquer ser humano que passou pela estratificação, seja o operário do ABC em São Paulo, seja um camponês do fundo de Goiás, ele é um ser humano que sabe que o saber é do doutor, é um ser humano humilhado.

(...) Nós temos a pretensão que temos artistas, porque temos Portinari, porque temos Vila-Lobos, ou temos Beethoven. Então isso nos da aparência, o orgulho de que nós temos arte. Nós não temos arte porra nenhuma. Porque tanto Picasso quanto Beethoven pertencem a grupos muito pequenos. Bom, até que agora (1977) os instrumentos de massa estão permitindo que mais outras pessoas se comuniquem com isso. Mas é tudo um código complicado para que um popular chegue a entender isso. Na maior parte das vezes não chega. Ninguém chega a entender.

É uma artezinha super especializada para gozo de um grupozinho, como mais um atributo, mais uma regalia, mais um privilégio dos super privilégios. Mais um privilégio dos super privilegiados.

(...) Esses povos, que falavam tantas línguas, e que eram tão variados, tinham entretanto grande blocos, e alguns deles eram blocos mais evoluídos. Por exemplo, só se encontra com segurança, uma sociedade humana vivendo do cultivo, da agricultura, de seus roçados, da criação de animais, sobretudo vivendo da agricultura, só se encontra uma sociedade codependente da coleta de coisas selvagens, de procurar as coisas onde a natureza lançou, para fazer com que a natureza seja disciplinada e se reproduza na roça onde ele quer, só se encontra isso na humanidade, há 12000 anos atrás.

E essa era a condição das populações indígenas mais avançadas do Brasil, na maior parte dos índios do Brasil. Então os índios do Brasil tem de comum com os outros seres humanos, 1 milhão de anos, que durou o processo de humanização. O homem levou 1 milhão de anos para construir a si mesmo. Pois bem, esse 1 milhão de anos, o último segundo da História, esses 10 mil anos, é que nós nos diferenciamos deles. Nós, agora, somos um povo e eles ficaram como nós éramos à 10 mil anos atrás.

(...) Uma coisa muito interessante na História brasileira, que acontece entre os índios que falavam a mesma língua, quando capturavam um sujeito de outro grupo, ele vivia casado, tendo filhos, durante um ano, até esperar a grande festa. E depois, juntam todas as tribos amigas e fazem uma festa para comer aquele sujeito. Não era bem para alimentar, porque tinha que ter outro alimento, porque 800 pessoas se juntavam para comer um homem. A quantidade que dá para cada um é muito pequena. Então fazia uma paçoca que continha a alma daquele homem.

(...) 00.18:15 - agora o que eu queria assinalar é isso, desses grupos agrícolas, havia pelo menos 4 ordens de tribos importantes: os tupi-guaranis, os aruaques, os caribes e os . Desse povos todos, o mais interessante para nós brasileiros são os tupi-guarani, porque nós somos herdeiros do tupi-guarani. Nós, de certa forma,somos tupi-guarani. Foi com os tupi-guarani que nós aprendemos a ser. Foram eles que os portugueses encontraram aqui na costa. Foram eles que nos deram os nomes para a terra. Quando a gente fala o nome das pedras, o nome dos bichos, o nome das plantas, nós estamos falando Tupi.

(..) 00:26 - As primeiras tipografias das América, os primeiros livros impressos, foram impressos nas missões jesuíticas. Os primeiros artesãos capazes de fazer um cronômetro, por exemplo, um relógio que pudesse ser usado para a navegação, que era muito importante, foram feitos nas missões jesuíticas, as primeiras fundições de ferro também. A altura e a qualidade da arquitetura que eles alcançaram, e que tem restos e que ainda a gente pode ver no Rio Grande do Sul, é uma coisa admirável. O que era lindo é que eram populações enormes, crescentes e populações de imensa prosperidade. As missões jesuíticas perseguiam o sonho de fazer uma sociedade perfeita e igualitária, dando educação e todos.

Selecionava-se os artesãos, os artífices, os operários, os líderes, os agricultores. Essa espécie de sociedade perfeita do comunismo católico, cristão, primitivo, essa espécie de sociedade perfeita teve contra ela inimigos tremendos. O mais tremendo inimigo inicial foi o paulista. Os chamados mamelucos paulistas caíram sobre as missões jesuíticas como um flagelo.

Uma bandeira paulista, para atacar os índios, era uma bandeira de 2000, 3000, podiam chegar a 5000 pessoas, que era uma cidade móvel, que parava 6 vezes para fazer roça, depois iam andando lentamento, e quando chegava diante da missão fazia todo esforço para fazer o cerco e afinal capturar a missão.

As missões só puderam se defender realmente depois que os jesuítas se convenceram de que não podiam aceitar a instrução do rei de Espanha de que essas seriam povoações desarmadas. E armaram, ensinaram a fazer armas e enfrentaram os paulistas.

As missões foram assaltadas agora por gente que queria tirar as riquezas, os castiçais de ouro e de prata. E escravizar os índios, domar os índios. Escravizar e tomar suas terras. Então os ataques que fizeram os gaúchos do Rio Grande do Sul, os paraguaios, os argentinos, sucessivamente, foram tremendos, de forma tal que esses povos se viram dizimados. Uma das maiores hecatombes da História.

É preciso meditar um pouco sobre aquela experiência, que foi a primeira experiência do socialismo, do comunismo com os índios, de que ocorreu uma dos maiores desastres das Américas.

É uma coisa curiosa que naquela época começaram a chamar os paulistas de mameluco. Mamelucos, que a gente usa em português para indicar uma mistura de índio com branco, e o paulista seria o mameluco.

Quem chamou primeiro os paulistas de mamelucos foram os jesuítas espanhóis. Agora, por que mamelucos? Mameluco é uma palavra árabe para designar um ser hediondo, um “pau mandado”, um traidor de sua própria gente. Aquele que foi tirado da sua gente e que volta a ela como castigador.

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