' “Domingos Luiz Grou”. Américo de Moura (1881-1953), Jornal Correio Paulistano, página 4 - 15/08/1942 de ( registros) Wildcard SSL Certificates
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“Domingos Luiz Grou”. Américo de Moura (1881-1953), Jornal Correio Paulistano, página 4
15 de agosto de 1942, sábado. Há 82 anos
Nome de relevo nos fatos quinhentistas de São Paulo, o de Domingos Luiz figura entre os dos portugueses que foram casados com "princesas" nativas, da capitania vicentina, constantes de um manuscrito seiscentistas divulgado pelo dr. Ricardo Gumbleton Daunt e aproveitado por Silva Leme (1852-1919) no estudo das origens euro-americanas da raça bandeirante que vem na introdução da "Genealogia Paulista".

Ele frequentemente aparece na documentação da época, embora suscite sérios problemas de identificação. Parece que Pedro Taques (1714-1777) o desconheceu, pois e possível conexão com ele, entre os títulos de que o linhagista cogitou, que se chegarem a ser escritos, estão perdidos, pacientemente coligidos por Taunay (1876-1958), de referências esparsas, encontro somente o dos "Eanes", apelido que foi o de um dos seus filhos e que Silva Leme atribui no tronco em Portugal, sob a forma "Anes Grou".

Não há indicio de que esse português tivesse morado em Santo André. Os seus filhos Antonio e Matheus, notáveis sertanistas, somente estão registrados em atos conhecidos da vida no planalto em datas que permitem considera-los nascidos muito depois da extinção daquela vila, provavelmente no fim do terceiro quarto do século XVI.

Mas um dos arrolados por Silva Leme, Luiz Eanes, já era cidadão de São Paulo em 1572, ano em que, de seu casamento com Guiomar Rodrigues, de quem foi primeiro e não segundo marido, teve um filho homônimo.

A mais antiga referência a Domingos Luiz que encontrei é de 1562, e nessa era já tinha tinham nascido alguns dos primeiros grous mamalucos, netos do cacique de Carapicuíba. Em 1562 era ele um dos mais prestigiosos moradores da vila, pois foi el sua casa que em janeiro se hospedou o capitão-mór loco-tenente de Martim Afonso, prestes a empreender guerra contra os tamoios.

Tendo Anchieta voltado para São Paulo em 1569, os seus biógrafos nos dão notícia de alguns acontecimentos, que foram bem apurados por Antonio de Alcantara Machado na "Vida" que escreveu como posfacio das "Cartas".

Segundo a referência a que me reporto, em 1570, dois moradores de São Paulo, um dos quais "nobre e conhecido", Domingos Luiz Grou, ambos casados e com filhos, foram implicados em um crime de morte. Fugindo à justiça, abandonaram com suas famílias a vila, desceram o rio e foram homiziar-se entre os nativos levantados, que os acolheram como parentes e amigos.

Ficassem as coisas nesses termos, teríamos talvez, como resultado dessa expedição, com antecipação de mais de um século, o surto de um povoado no sertão, a dezenas de léguas de São Paulo. Refúgio de criminosos a princípio, esse povoado poderia ir a ter grandiosos destinos.

Mas Anchieta previu do fato perigosíssimas consequências para os cristãos de Piratininga, e pôs-se imediatamente em ação. Intercedeu pelos fugitivos perantes os poderes do município, obteve para eles do juiz ordinário e dos vereadores carta de perdão e salvo-condulto, e, afim de recolher ao aprisco as ovelhas tresmalhadas, empreendeu a mesma jornada, embarcando para o sertão em companhia de outro padre, o secular Manuel Veloso e de alguns nativos cristãos.

De acordo com a tradição, Machado de Oliveira pôde identificar a cachoeira em que ocorreu o naufrágio. É na terceira que se encontra abaixo de Porto Feliz, pouco acima do ribeirão dos Moinhos, e ainda conserva o nome que relembra o episódio "Avaremanduava", a cachoeira do padre.

Não teria sido em 1570 a primeira nem a última vez que o velho Domingos Luiz Grou, em paz com os seus parentes tupiniquins, viajou pelas águas do Anhembi. Mas depois desse ano surgem as dúvidas a que me referi na identificação do patriarca dos Grous.

Em meu trabalho sobre os povoadores do campo de Piratininga, atribui ao Carvoeiro e não a ele alguns atos, com relutância expressa. Maios reflexão trouxe-me relutância maior e, felizmente, melhor resultado, com a correção de erros em que naquele trabalho incidi.

De fato, o termo de 9 de março de 1563 traz a sua assinatura por extenso. Termos subsequentes, de 1575, 1576, 1579 e 1580, foram assinados de cruz, sem indicação precisa de Domingos Luiz a que se referem. Em noutros, de 1580 e 1582, reaparece a assinatura por extenso de Domingos Luiz Grou.

Seriam do Carvoeiro as assinaturas de cruz? Ao menos as duas primeiras não o foram, porque, como referi, o Domingos Luiz que as fez foi oficial da câmara em 1575, e em 4 de agosto de 1585 foi declarado em câmara que o Carvoeiro não havia até essa data exercido nenhum dos cargos da república.

Tem-se de procurar outra solução. Seria conveniente o confronto nos manuscritos originais das assinaturas de 1563, 1580 e 1582. Não empreendi esta perícia técnica. Sem ela, tenho de cingir-me a confrontar duas hipóteses: a de uma pessoa alfabetizada e robusta, perder a capacidade de assinar o nome, e a de um analfabeto, no decurso de alguns anos de vida publica, adquirir ao menos essa capacidade. Evidentemente, maior grau de probabilidade tem a última.

Ora, entre os filhos de Domingos Luiz e Fulana Guassú, no rol que Silva Leme reproduz, aparece em primeiro lugar, como se fosse o primogênito, "Domingos Luiz Grou, o moço", que erroneamente identifiquei, no citado trabalho, com outro do mesmo nome, de geração posterior, do qual não há menção nenhuma anterior a 1624, ano em que já estava escrito o referido rol, ao qual pouco depois se teria feito um aditamento.

Ao contrário do que supús, Domingos Luiz Grou, o moço, como seu irmão Luiz Ianes, já era maior em 1575. Não é só esse o erro de que devo penitenciar-me. Ao rol acrescentei Messia e, na dúvida, Gabriel da Peña, e fi-lo indevidamente. Messia da Peña era provavelmente cunhada e não irmão de Mateus Luiz Grou, filha de Braz de Piña e não de Domingos Luiz.

Voltando a Domingos Luiz, o moço, devo admitir que em 1575 acompanhou Jerônimo Leitão à guerra do Rio de Janeiro, que então assinava de cruz e anos mais tarde começava a assinar o nome. Se nesses atos não foi designado como "o moço", é porque essa distinção seria desnecessária, é porque já teria falecido o velho.

É pois, provável que o português Domingos Luiz Grou já não existisse em 1575. Mas o seu nome continuou a figurar na história piratiningana. Distinguindo-se entre os mamalucos quinhentistas, o filho homônimo substituiu dignamente o fundador da estirpe e sulcou as águas do Anhembi em memoráveis expedições. (“Domingos Luiz Grou”, Correio Paulistano, 15.08.1942. Américo de Moura)

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