“História de Santos”. Francisco Martins dos Santos
1937. Há 87 anos
Por outro lado, diz o Padre Francisco do Nascimento Silveira, em seu "APPARATO CHOROGRAPHICO", que antes de Colombo descobrir a América, já a haviam descoberto quatro pilotos portuguezes: Pedro Corrêa, Vicente Dias, Affonso Sanches e Martim Vicente.
Sobre Affonso Sanches convérgem de forma categórica e convincente os depoimentos dos mais antigos e notáveis autores, de tal maneira, que não seria demais se lhe conferissem definitivamente os lauréis de verdadeiro descobridor da América.
Assim, lemos — em Frei Antonio de São Romão, na "HISTORIA GERAL DAS ÍNDIAS O CCIDENTAES escripta em 1557, que Colombo foi á América servindo-se dos papéis de cérto marinheiro famoso que lhe morrera nos braços (Affonso Sanches).
Garcilaso de La Vega, autôr da mesma época, nos "Commentarios Reales" affirma que Affonso Sanches foi o primeiro descobridor da América. Pedro de Mariz, nos "DIÁLOGOS DA VARIA HISTORIA" de 1594, faz a mesma afirmação.
O Padre Manoel Fialho, em "ÉVORA GLORIOSA", de 1728, diz que Affonso Sanches adoeceu na casa de Christovam Colombo, genovez que morava no Funchal, onde tinha casa de pasto, vivendo disso e de ilustrar cartas geográficas para o que tinha muita habilidade, onde sentindo-se morrer, como gratidão por quanto lhe proporcionára Colombo, a elle fizéra entréga "in articulo mortis", como presente de grande valor e que lhe pagaria de tudo, das suas cartas de marear e do roteiro que tinha feito desde a Terra-Nóva até á Ilha da Madeira onde morava. Explica também aquelle autôr, que Affonso Sanches vivia de viagens em barco próprio, de Lisboa para os Açores, commerciando entre as ilhas e o continente, e que, numa dessas viagens em 1486, apanhado por violentos temporaes se afastára tanto da rota costumeira, que acabára por descobrir uma nova terra, que certamente por isso denominára de Terra Nova.
Brito Freire, na "HISTORIA DA NOVA LUZITANIA" — 1675 — conta a mesma cousa. Frei Apolonio da Conceição, na "PRIMAZIA SERÁFICA NA REGIÃO DA AMÉRICA", de 1733, faz idêntica descripção histórica. Simão de Vasconcelos (1597-1671), em sua famosa" CHRONICA DA COMPANHIA DE JESUS"; Gaspar da Madre de Deus (1715-1800) em suas "NOTICIAS DOS ANNOS EM QUE SE DESCOBRIU O BRASIL", José de Sousa Azevedo Pizarro e Araújo (1753-1830), Manuel Aires de Casal (1754-1821), Cunha Mattos, Mello Moraes, Jean de Laet (1571-1649 e tantos outros grandes escritores, cronistas e historiadores de mérito reconhecido, estão conformes com esta verdade, mas, um dos fatores que mais concorre para a definitiva consagração do descobridor Affonso Sanches, é o depoimento insuspeito dos historiadores italianos e hespanhóes em seu favor, quando é sabido que elles deveriam ter mais interesse na primazia de Colombo, genovês a serviço da Hespanha.
É que tais historiadores, á vaidade de um merecimento pátrio inverídico, preferiram a verdade da História e a ella se cingiram portanto. Táes são: Antonio Remosal "HISTORIA GENERAL DE LAS ÍNDIAS OCCIDENTALES"; J. Baptista Ramuzio "NAVIGAZIONI E VIAGGI"; Capellan "VIAGE DE LA NUEVA FRANCIA"; B. de Las Casas — "OBRAS Y VIAGES"; Bernardo de Vargas — "DESCRIPCION DE LAS ÍNDIAS"; José Acosta — "HISTORIA NATURAL DE LAS ÍNDIAS", e Pedro de Cieca "CHRONICA DEL PERU" (1)
Esta versão de Affonso Sanches, é autenticada mas ligeiramente alterada pelo próprio Colombo, quando em seu "Diário", achando-se então ancorado em Gomera, nas Canárias, recorda que um homem viéra da Madeira em 1484, pedir ao Rei de Portugal, uma caravella para "descobrir" uma ilha que descobrira e que jurava ver cada anno, sempre na mesma direcção.
Por sua vez, com pequena differença, Fernando Colombo, positivando as declarações de, seu pae, o pretenso descobridor, em sua "Historie deli Ammiraglio", no Cap. IX, referindo-se á passagem de Oviedo, rectifica-a, declarando que foi um português de Tavira, Vicente Dias, regressando de Guiné á Terceira, com escala pela Madeira, quem contára a Colombo ter avistado uma ilha no rumo do Poente, para onde o vento lhe impellira, durante dias, o navio. [Página 5]
Henrique Montes, companheiro de Melchor Ramirez e como ele sobrevivente da Expedição Sólis, viveu por muitos anos em São Vicente e na região do "Prata", onde Diogo Garcia e outros expedicionários foram encontra-lo por vezes, e foi companheiro e colaborador de Gonçalo da Costa e do "bacharel".
A ambição parece, foi o que provocou a sua desgraça, levando-o a pôr-se em desacordo com os seus amigos e protetores, por desejar umas terras que estiam em poder do mesmo "bacharel" ou de um dos seus genros. Essas terras éram as de Jurubatuba e principalmente as da atual ilha Barnabé, onde podiam-se fazer todas as criações imagináveis sem necessidade de cercas e sem o perigo dos animais do mato que naquele tempo infestavam todos os lugares. [“História de Santos”, 1937. Francisco Martins dos Santos. Página 62]
O próprio Alonso de Santa Cruz diz no YSLARIO: (1530)
"Tem estas duas ilhas (São Vicente e Santo Amaro) um ilhéo entre ambas de que se servem para criar porcos."
Manifestadamente, esse ilhéo, a que se refere o oficial de Caboto, é a atual ilha Barnabé, única existente entre as duas ilhas de São Vicente e Santo Amaro, como única em que se poderia fazer uma grande criação de qualquer espécie animal, sem o risco de evasão e ataque de féras ou bichos daninhos. Essa ilhóta, aliás, está bem determinada no mapa XIV do "Yslario", que já vimos.
Ligue-se isso ao fato de ter sido o primeiro ato de Henrique Montes ao chegar novamente a São Vicente com Martim Afonso, tomar posse da mesma ilha e terras adjacentes e teremos a prova concludente de que a queda do "Bacharel" e de seu genro Gonçalo da Costa, foi fruto da sua ambição, naturalmente alimentada por mais alguém (Ramalho, Rodrigues e Antonio Ribeiro como já fizemos entender).
Sobre tudo isto, surge o assassinato de Henrique Montes algum tempo depois, como um desforço ou punição levado a efeito pelo possível autor do crime, e ainda mais nos firmamos em nosso ponto de vista. A escritura de Braz Cubas, de 25 de setembro de 1536 revela bastante a respeito, ajudando sobremaneira a reconstituição da história local, dizendo:
"... logo fez ao dito Braz Cubas livre e pura irrevogável doação entre vivos valedoira deste dia para todo o sempre para ele a para todos os seus herdeiros e sucessores que depois dele viérem, DE TODA A TERRA QUE TINHA E POSSUÍA NO BRAZIL UM HENRIQUE MONTES, QUE MATARAM NO BRAZIL, a qual terra está na Povoação de São Vicente, do dito senhor Martim Afonso e a dita terra poderá ser de grandura de duas léguas e meia pouco mais ou menos... e que está donde chamam JARABATYBA, assim que pelo braço de março dentro E MAIS LHE FAZ DOAÇÃO DE UMA ILHA PEQUENA QUE ESTÁ JUNTA DA DITA TERRA QUE OUTRO SIM ERA DO DITO HENRIQUE MONTES... POSTO QUE O DITO HENRIQUE MONTES TINHA DO DITO SENHOR MARTIM AFONSO SEM TER DELE ESCRITURA, erc..."
Nesse importantíssimo documento, tão pouco debatido pelos nossos historiadores, vemos confirmado o assassinato de Henrique Montes, algum tempo antes daquele ano de 1536 e o seu domínio sobre as mesmas terras da ilha, onde, no depoimento de Alonso de Santa Cruz, OS PORTUGUESES CRIAVAM PORCOS alguns anos antes da vinda de Martim Afonso.
A morte de Henrique Montes, em nossa opinião, ou foi promovida por Paulo Adorno em 1553, o qual sabe-se ter cometido um crime naquela altura, motivo porque fugiu para a Bahia, logo em seguida, onde ficou e constituiu família casando com uma filha de Diogo Alvares, o Caramurú, ou o foi pelas forças de Iguape, sob o comando do "bacharel" Mestre Cosme e do espanhól Mosquera, por ocasião da invasão de São Vicente, o que é ainda mais provável. [Páginas 62, 63 e 64]
A propósito convém lembrar, que, Anchieta, que melhor do que ninguém poderia escrever bem o nóme da primitiva gente de São Paulo, que o secundava nos trabalhos iniciaes de Piratininga, escreveu: GUAIANÃ, preferindo a orthoépia mais approximada da enunciação aborígene e da verdade etymológica, como a orthographia mais digna de ser trans- mittida á posteridade. Não o comprehenderam, porem, os homens das nóvas gerações, e, assim attribuiram á palavra origens várias como á própria gente que ella designava. (Página 115) [0]
Este é o nome primitivo, brasílico, da ilha de S. Vicente onde assenta a cidade de Santos, como se vê na escriptura das primeiras terras doadas a Pero de Góes, em 1532. Gohayó é corruptéla de GU-AÍ-ÓG "cortada, despegada"; de GU — reciproco — Aí — "despegar, abrir, separar", e ÓG — "cortar, arrancar", sendo que os verbos Aí e ÓG apparécem unidos para exprimirem separação por força. Allusivo a ter .sido a ilha, separada do continente pela força e pressão das aguas ou por algum phenómeno sismico occorrido no correr dos séculos.
Deste nome saiu a denominação GUAIANAZES havida pelos indígenas originários da região, os famósos GUAIANÂ das cartas de Anchieta, que tão marcante papel tiveram em toda a antiga Capitania de São Vicente.
O nóme São Vicente, como já demonstrámos no Capitulo próprio, foi dado á mesma ilha, em 1502, a 22 de Janeiro desse anno, por Américo Vespucio, o célebre florentino, cos- mógrapho da Expedição official de André Gonçalves, quan- do elle denominou o actual estuário santista, de "Rio de São Vicente". (Página 104) [0]
Itororó - Nome da fonte histórica junto á qual se estabeleceram Paschoal Fernandes e Domingos Pires, os dois principais fundadores da cidade, logo após a chegada de Martim Afonso de Souza. Ficava como fica ainda hoje (1937), na encosta do Morro de São Jerônimo, nome depois trocado pelo de Monte Serrate, desde que se construiu entre os anos de 1603 e 1605, a ermida de Nossa Senhora de Montserrat. (Página 110) [0]
Em março de 1560 verifica-se a chegada de Mem de Sá á vila de Santos. Dois fatos importantes se registram: é extinta a vila de Santo André da Borda do Campo, onde Ramalho entravava o desenvolvimento da colonização de serra-acima com a sua extranha adesão aos trabalhos portugueses e dificultava a obra da catequese com os seus exemplos de desenfreada poligamia, erigindo-se em vila o povoado de 1554, São Paulo de Piratininga, fruto dos trabalhos de Nóbrega e da dedicação dos seus companheiros; e, junto á vila de Santos, próximo ao ribeirão de Itotoró, é construído o Forte da Vila, para sossego dos moradores. Nessa ocasião, partindo Mem de Sá, levou do Porto de Santos e da vizinha vila de São Vicente, algumas forças e embarcações ligeiras para combate aos francese de Villegaignon que infestavam o Rio de Janeiro. [Páginas 258 e 259]
Em 1650 verifica-se a fundação do Mosteiro de São Bento, efetuada na própria capela de Nossa Senhora do Desterro, capela referida anteriormente e que existia ao que parece desde os anos 1620, em terras que haviam pertencido a Mestre Bartholomeu Fernandes ou Gonçalves, o famoso ferreiro, vindo na Armada de Martim Afonso, e cujo filho Bartholomeu Fernandes Mourão doou-a á Ordem Beneditina.
Em 1656, a 27 de abril, a Igreja do Monte Serrate, edificada em 1602 por D. Francisco Souza, era doada aos beneditinos. (História do Brasil, História de São Paulo, História de Santos, 1937. Francisco Martins dos Santos. Página 268) [0]
*Francisco Martins dos Santos também concordava com a tese segundo a qual o Bacharel de Cananeia se chamava Cosme Fernandes, ao qual nome era precedido o título de Bacharel Mestre. Em sua “História de Santos”, Martins afirma ter sido ele o primeiro a identificar o Bacharel como sendo Mestre Cosme FernandesFrancisco Martins dos Santos também concordava com a tese segundo a qual o Bacharel de Cananeia se chamava Cosme Fernandes, ao qual nome era precedido o título de Bacharel Mestre. Em sua “História de Santos”, Martins afirma ter sido ele o primeiro a identificar o Bacharel como sendo Mestre Cosme Fernandes, isso no ano de 1937. [2]