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A “Ilha Brasil” de Jaime Cortesão: ideias geográficas e expressão cartográfica de um conceito geopolítico. Francisco Roque de Oliveira
25 de fevereiro de 201706/04/2024 12:47:42

comunicam directamente entre si por alguns dos tributários, formando verdadeiras ilhas»45.Mas mesmo sem a identificação dos autores em causa, ficavam esclarecidos os fundamentosfísicos que haveriam de dar lugar à lenta construção do Estado brasileiro a partir da criação eda projecção de uma série de mitos expansionistas – «e, mais que todos, o da Ilha-Brasil»46.Cortesão explorará este tema recorrente no seu magistério em subsequentes artigos desta sériecomo, por exemplo, «O índio: bússola e mapa vivo», «Sentido da geomítica do Brasil», «Aprimeira bandeira no papel», «A Ilha-Brasil e os vicentistas», «Origens indígenas da IlhaBrasil», «Carácter do mito da Ilha-Brasil» e «A Companhia de Jesus e a Ilha-Brasil» – todoseles posteriormente inseridos na Introdução à História das Bandeiras.Ainda antes de se deter na leitura dos mapas de origem portuguesa que trariam a marcaindelével do «mito da Ilha-Brasil», Cortesão arrisca estabelecer uma linha de continuidadeentre a consciência geográfica e as representações cartográficas quinhentistas e seiscentistasde origem indígena do futuro espaço brasileiro e a aprendizagem do mesmo espaço por partedos primeiros colonizadores. Apesar de admitir expressamente não conhecer exemplosconcretos de cartografia tupi-guarani ou aruaque desse período, não evita assumir como certae segura a sua suposição. Uma vez mais, a sua convicção profunda impõem-se à necessidadeda prova positiva. Uma vez mais também, a força da sua prosa poética não constitui o menordos argumentos: «Astronomia incipiente e representação plástica ou cartográfica do territórionão passam de manifestações do mesmo e maravilhoso sentido de orientação. Sentido vital eorgânico. Superlativo do instinto das aves migradoras. Como outros povos nómades, osprimitivos habitantes do Brasil eram verdadeiras bússolas e mapas vivos»47.Nada atrapalha a circunstância de não sobrar uma linha de continuidade tangível entre estacartografia oculta e indemonstrável e a prefiguração do conceito da insularidade brasileira queCortesão começou por identificar nas suas leituras dos textos franceses de João Afonso edepois estendeu aos mapas. No seu entendimento, a construção do território assenta numconceito quase imanente de espaço que precede o seu reconhecimento objectivo e a sua posse:«Antecipando-se ao conhecimento pleno, prefigura a realidade, concebendo-a a seu modo edando-lhe uma força deflagradora de vontade. Aqui, pois, o homem, criando o mitogeográfico, faz o primeiro passo que vai do determinismo puro à liberdade»48. No limite, ademonstração cartográfica surge a jusante de tudo, mais como um discurso sobre o espaço ouuma representação detentora de uma eficácia geopolítica sobre o real, do que como clássica eescorreita tradução pictórica do próprio real: «Antecipando-se ao conhecimento pleno de umaentidade geográfica e económica», repete Cortesão, «o português concebeu-a sob a formamítica da Ilha-Brasil e passou a cingir os mapas a esta realidade. Compreendeu ràpidamenteque à estreita faixa do continente, talhada pelo meridiano divisório, era indispensável darfundo geográfico e possibilidade de circulação e defesa, ou seja, viabilidade política, em faceda poderosa América Espanhola»49.Também esta conclusão replicava o que já vimos escrito pela pena de Jaime Cortesão novolume da História da Expansão Portuguesa no Mundo publicado em 1940. A principaldiferença será que, agora, Cortesão se vai deter, por fim, na identificação pormenorizada dassucessivas representações cartográficas do «mito da Ilha-Brasil» através do comentário a um conjunto seleccionado de mapas portugueses e de proveniência castelhana.

"A primeira bandeira no papel" traz logo em título a sugestão disso mesmo, sendo o mapa do Brasil inserto no designado Atlas Miller de Lopo Homem-Reinéis (1519) o principal objecto de análise:

""Lá está a grande protuberância oriental da América do Sul, firmemente traçada desde as duas largas aberturas do Amazonas (com o contorno da ilha de Marajó, quaseinteiramente delineado) até ao vastíssimo rasgão do estuário do Prata, e parte da costa que selhe segue ao sul. Ao alto da carta, numa larga cartela, uma legenda em latim ensina que “Estaé a carta da região do Grande Brasil”, situado ao ocidente das Antilhas de Castela, referindose a seguir aos habitantes, à fauna e à floresta da nova terra"50. É o mapa que Cortesãoidentifica como aquele que representa «apenas uma primeira fase do mito da Ilha-Brasil»,ainda que bastando a legenda que identifica o magni brasilis para termos já demarcada «aentidade geográfica natural e humana» que pretende inconfundível com o resto51 (figura 1).

No artigo “A Ilha-Brasil dos vicentistas” – alusão ao momento, no século XVI, em que São Vicente polarizava a instalação da colónia portuguesa nas áreas meridionais do Brasil –, o leitor passará directamente das referências colhidas nos escritos de João Afonso “a uma Ilha Brasil” circum-navegável entre a foz do Amazonas e a boca do Prata para uma selecção de mapas que reproduzem a mesma ideia da ligação entre estes dois grandes rios sul-americanos articulada por um grande lago interior, cuja designação se modifica de mapa para mapa.

Nessa lista expurgada das centenas de cartas que copiariam este modelo cartográfico até meados do século XVII – mais precisamente, até à carta da América meridional de Nicolas Sanson d´Abbeville de 1650 – Cortesão inclui o mapa do Novo Mundo do grupo de quatro cartas que formam o planisfério de Bartolomeu Velho de 1561 (figura 2), a carta atlântica de Luís Teixeira de c. 1600 (figura 3), a carta da América do Sul de Lucas de Quirós de 1618, destacando, ainda assim, o primeiro destes três espécimes cartográficos:

"De todas as cartas a mais notável e extraordinária é o mapa de Bartolomeu Velho, de 1561, onde o Brasil aparece claramente delimitado como uma ilha enorme, subdividida em ilhas mais pequenas. O Prata e o Pará, este último assim nomeado e na posição aproximada do Tocantins, ligam-se e comunicam-se pela vastíssima lagoa Eupana, ao sul da qual se vê o “Mar grande ou Paraguaia”, que identificamos com os pantanais dos Xarais. Da mesma lagoa nasce o S. Francisco, o qual se reúne por um lado menor ao Parnaíba e mais abaixo ao Paraná, que, por sua vez, se reúne à lagoa Eupana, encerrando esta ligações em seu conjunto de cinco ilhas".Este mapa de Bartolomeu Velho servirá de mote para o artigo sobre as "Origens indígenas da Ilha-Brasil" da mesma séria dedicada às bandeiras paulistas, ou não fosse esse "o primeiro mapa onde a Ilha-Brasil, delineada como um todo orgânico e em oposição ou como complemento à divisória de Tordesilhas, aparece pela primeira vez".

Por seu turno, em "Carácter do mito da Ilha-Brasil", Cortesão confronta-o com a representação divergente dos vastos circuitos fluviais sul-americanos na cartografia espanhola representada pelo mapa da América de Diego Gutiérrez gravado em 1562 em Amesterdão (lapso por Antuérpia), intuindo daí que portugueses e espanhóis podiam haver recebido dos indígenas as mesmas informações sobre essa geografia interior, «mas uns e outros seleccionaram e adaptaram essasinformações às suas tendências e propósitos»55. E a esperada conclusão, que reunia a provados textos à dos mapas:«Hoje sabemos que a Ilha-Brasil, tal como a definiu João Afonso e a representava Bartolomeu Velho,não é geogràficamente exacta. Trata-se de um mito, isto é, de uma criação ideal, em que se fundemcrepuscularmente uma realidade geográfica e humana, mal conhecida, e a ambição de lhe dar validadepolítica. A Ilha-Brasil é um mito expansionista, em que se antecipa a solução o problema e do conflitode soberania, entre Portugal e Espanha»56. [Páginas 11, 12 e 13]
A “Ilha Brasil” de Jaime Cortesão: ideias geográficas e expressão cartográfica de um conceito geopolítico. Francisco Roque de Oliveira

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