Rebeldia no Planalto: A Expulsão dos Padres Jesuítas da Vila de São Paulo de Piratininga no Contexto da Restauração (1627-1655) - 01/01/2006 de ( registros)
Rebeldia no Planalto: A Expulsão dos Padres Jesuítas da Vila de São Paulo de Piratininga no Contexto da Restauração (1627-1655)
2006. Há 18 anos
violência, o primado da jurisdição civil sobre a eclesiástica e, conseqüentemente, aadaptação às realidades locais e aos livres instintos despertados pelo novo ambiente.48O avanço sobre terras até então pertencentes à Coroa hispânica, em regiões comoGuairá, Itatim e Tape,49 inauguram a fase das grandes expedições promovidas pelospaulistas, causadas, provavelmente, pela dizimação ou pelo desaparecimento das tribospróximas às cercanias de São Paulo.50 Alguns estudiosos crêem que as expedições deapresamento oriundas de São Paulo pouco tinham a ver com a expansão territorial.Entretanto, é possível afirmar que os paulistas tinham consciência da ação expansionistaque realizavam, como se pode constatar de queixas registradas na Câmara.Os oficiais da vereação, reunidos aos dois dias do mês de outubro de 1627,constando do juiz João Fernandes Saavedra, o vereador João de Brito Casão,Rafael de Oliveira, Sebastião Fernandes Preto, o procurador Cosme da Silva,declaram-se contrários aos espanhóis de Vila Rica, que estavam fazendoentradas nas terras da coroa de Portugal [deixando claro a autonomia quePortugal detinha frente a União Ibérica], criticam que vêm, os espanhóis, seapossando dos bens dos colonos, descendo gentios para seus repartimentos eserviços, deixando em grande problema a capitania. Exigiam do capitão-more da governadoria da região, medidas enérgicas contra o abuso dos direitosadquiridos.51Portanto, as expedições realizadas pelos paulistas não eram aleatórias, muito pelocontrário. Existiam objetivos claramente delimitados: de um lado o apresamentoindígena, vital à economia da região; de outro a conquista de terras.De qualquer forma, o fato é que entre os anos de 1628 e 1650 aumentouconsideravelmente o acesso aos apresados. Não se pode negar que alguns desses cativosforam negociados em outras capitanias, principalmente nos momentos em que seconstituíam excedentes. Esse foi o caso evidenciado pela devassa pública realizada emSalvador, em 1629, relacionada à campanha de Raposo Tavares em Guairá, após aqueixa apresentada pelos padres Mansilha e Mazzeti. Relatam as testemunhas que 47cativos carijó haviam sido embarcados em Santos para serem vendidos no Rio deJaneiro, Espírito Santo e Bahia. A maioria fora desembarcada no Espírito Santo, masdois meninos, de oito ou nove anos, tinham seguido até Salvador. Uma segundaembarcação transportara dez ou onze carijó, deixando quatro cativos no Rio de Janeiro. [Página 56]
que, através de atuação na Câmara, procuraram ampliar o conceito de guerra justa. Essa“guerra justa”, longe de atingir apenas as tribos hostis, espalhou-se por todo o sertão,fundamentada em argumentos tais como o engrandecimento do bem comum e aampliação dos emolumentos régios.Dessa forma, aos poucos, as entradas adquiriram a condição de bandeirassertanistas. O Registro Geral da Câmara permite observar esse processo detransformação, que fez das entradas – unidades militares de defesa, mais ou menosestáticas, contra os ataques de índios hostis – formações de ataque e apresamento deindígenas, além de instrumentos para a exploração do território, destinada a reivindicarsoberania política. Em 1592, os capitães de milícias ou agentes de ordenança eramtambém os chefes das expedições. Exemplo disso, Afonso Sardinha, nomeado “capitãoda gente da vila de São Paulo e seus termos”, foi encarregado, após quatro meses, de irao sertão como “capitão da dita entrada”.4Entre 1590 e 1612, o governador geral do Estado do Brasil, D. Francisco deSousa, instituiu o alistamento militar de toda a gente de guerra, a partir dos 14 anos,incluindo os índios, assim como o arrolamento de todas as armas, espingardas, espadas,arcos e flechas. Desta forma, desde a adolescência, os homens educavam-se paradesempenhar atividades militares, e as companhias passaram a contar com o auxílio dogentio da terra. Em outras palavras, nesses inícios do século, as expedições ganhavamum caráter belicoso oficializado.A partir do assalto à vila de Santos, em 1624, e das invasões holandesas nonordeste, o serviço das bandeiras ganhou extensão e incremento. Sob o governo docapitão de São Paulo Pedro Vaz de Barros, em 1602, já tinham sido nomeados comocapitães das companhias alguns dos importantes bandeirantes do período seguinte:Antônio Raposo Tavares, André Fernandes, Antônio Pedroso e Francisco de MeloCoutinho.5 Na verdade, o caráter de oficialidade das bandeiras, obra de D. Francisco deSousa (1590-1602), fundamentava-se num projeto agro-minerador, que visava aodesenvolvimento do planalto e à descoberta do ouro, o que atraiu a atenção do governogeral do Brasil para São Vicente. Em 1627, essas mudanças transpareciam sob a formade tensões no interior da Câmara.
vereador Rafael de Oliveira, o vereador Fernadez Preto, João Brito Casão, oprocurador Cosme da Silva, na intenção de coibir o tráfico gentio e a ida aosertão. Lançaram voz de prisão a Antônio Raposo Tavares e Paulo doAmaral, com a acusação de serem amotinadores do povo, incitando-le aquebra da ordem e da obediência às leis [...]. E não os podendo prender letomarão a pólvora e chumbo que levam os quais irão até o termo e dali nãopassarão. E assim prenderam a todos os mais que vão ao sertão o que tudoconcordaram por estarem bem informados.6Da análise desse trecho das Actas, constata-se que o quadro do desenvolvimentobandeirante já ia bem adiantado; havia ainda, porém, uma certa contradição najurisprudência que regia o planalto. Tal contradição devia-se à ambigüidade da lei de1611, que, por um lado, concedia liberdade a todos os indígenas – pagãos e aldeados –mas, por outro, permitia o apresamento dos nativos através da guerra justa. Além disso,os camaristas exerciam o dever de executar as ordens régias de regular as entradas nosertão. Entretanto, a rotatividade desses oficiais permitia que eles próprios seentregassem ao ofício de prear, não diferente dos outros senhores de São Paulo, queviviam de seus plantéis e de seus escravos. Talvez seja uma das respostas para entenderporque não foram presos Antônio Raposo e Paulo do Amaral.Essa aparente antítese revela os contornos complexos do universo normativo doAntigo Regime. Nas sociedades européias e ultramarinas dos séculos XVI ao XVIII, asrelações de natureza institucional ou jurídica tinham tendência a se misturarem ecoexistirem com outras relações paralelas, que se assumiam como tão ou maisimportantes do que as primeiras, baseando-se em critérios de amizade, parentesco,fidelidade, honra e serviço.7 Ou seja, nas palavras de Antônio Manuel Hespanha, asregras da vida em comum, a “constituição social”, baseava-se na dimensão natural,segundo a qual a sociedade, como um corpo, organizava sua funcionabilidade demembros a partir da natureza.8 E a natureza na qual inseriam-se esses homens eracaracterizada pela ausência da distinção das esferas pública e privada, mesmo emtermos teóricos. Portanto, não era incoerente o papel duplo assumido pelos atoressociais do mundo colonial, que, ao mesmo tempo, atuavam em instituiçõesrepresentativas de poder régio e cuidavam de seus interesses particulares. Os embatesresultantes dessa combinação expressavam as “tensões que perpassavam o corpo [Páginas 67 e 68]
empregada, natural às sociedades de Antigo Regime, escusando-se da existência de umdireito comunal fundamentado na ordem social e na própria legislação indígena daCoroa de Portugal. Esses discursos fomentavam cada vez mais um conflito que já eralatente.O padre Antônio Sepp expressava esse antagonismo em suas palavras, ao afirmaraos companheiros que “em verdade, em verdade, reverendos padres e caríssimosirmãos, aqui na pessoa desses pobres índios abandonados, encontro realmente meuJesus sofredor”.34 Em uma série de outras cartas, os padres missionários da Companhiade Jesus procuravam enaltecer seu trabalho evangélico e catequético, em detrimento dopoder belicoso apresentado pelos os paulistas:pela forma do direito, haja lugar, que os portugueses da vila de São Paulodestruíram e roubaram as reduções de índios cristãos e gentis, que os daCompanhia haviam reduzido nas províncias do Guairá [...], [tendo em]André Fernandes, um dos maiores ladrões de índios nos sertãos.Testemunhavam os reverendos padres: Francisco Vasquez Trujillo, Pablo deBenavides, Antônio Ruiz de Montoya, Andrés Tanay e Pedro Romero.35Partidários da liberdade gentílica, os inacianos entendiam quenenhum cristão poderia esperar a salvação de sua alma se, ao mesmo tempo,negava a outros homens os seus bens superiores. De acordo com a leinatural, pertencia aos índios a disposição sobre a própria vida. Com quedireito poderiam os portugueses apropriá-la? Alguém dirá que tudo isso nãolhe faz referência, mas, na verdade, o atinge tanto mais quanto ele e seusirmãos estiverem dispostos a oferecer sua vida por uma justa causa.36Apesar da vivacidade do discurso, a situação enfrentada pelos jesuítas eradesconfortável e humilhante, haja vista o número considerável de nativos aldeadosaprisionados na expedição do Guairá e em tantas outras realizadas, após as quaisrecolhiam-se os bandeirantes aos seus arraiais carregados de cativos e de uma espéciede glória particular. Por seu turno, os padres Simeão Mazzeti e Justo Mansilha,infamados de “cachorros e hereges” pela população de São Paulo, acompanharam osseus recém-batizados e presenciaram a destruição de tudo “o que viram prosperar”.Segundo a narrativa de Montoya,pediram por justiça em vários pontos [...] a tudo trapacearam as justiças e, jádesesperados de qualquer remédio, voltaram eles pelo mesmo caminho,sendo acompanhados de assobios e burlas a seu respeito. A própria justiça deSão Paulo foi em seu percalço junto com os seus moradores, chamando-os de cachorros, hereges, infames e atrevidos, que tratassem de voltar às suasterras. Indo os ditos dois religiosos, acolher-se ao Colégio ali existente epróprio da Companhia de Jesus, anteciparam-se-lhes alguns civis, que lhesfecharam as portas com ruídos e vozerio estranho e os levaram presos comordem de juízes, a que ali chamam de ‘câmara’.37A Relación de los agravios do padre Montoya ratifica a posição que os jesuítas daassistência da América Portuguesa atribuíram aos paulistas em seus discursos, acusandoRaposo Tavares, com a “sua insaciável cobiça de cativar índios”, de arrasar a obra deconversão que os missionários espanhóis desenvolviam no Paraguai a serviço do rei. A“inumanidade e a crueldade” eram as palavras que estampavam as ações dos súditosportugueses.38 Não se pode furtar em dizer que a despeito da violência e usurpação dospaulistas, a construção desse imaginário cruel em torno da figura dos bandeirantescumpria não só um papel humanitário, como também político. Afinal, esse tipo dediscurso defendia os interesses dos irmãos de Loyola na ampliação de seu poder sobreos nativos e na manutenção da intervenção direta exercida sobre a tutela da força detrabalho, com que também supriam as necessidades de suas propriedades.Assim, as andanças paulistas além fronteiras, e a constante falta de justiçaexercida pelas autoridades do Estado do Brasil, principalmente as de São Paulo,inflamava o geral da Companhia de Jesus na Província do Paraguai a exigirprovidências. Antônio Ruiz de Montoya, após suas reduções sofrerem novas invasões,resolveu abandonar a região do Guairá.39 Despachou o padre Espinosa com a missão dedescer toda a gente para a região do Salto do Paraná, acrescendo as reduções de Loretoe de Santo Inácio.40 Em fins de 1631,causava espanto verem-se, por toda aquela praia ocupados os índios emfabricarem balsas [...] cavados a modo de barco, sendo que sobre elas seconstrói uma casa bem coberta, e resistente à água e ao sol. Andava a genteempenhada em baixar à praia seus objetos caseiros, sua matalotagem, suasavezinhas e demais criação. O ruído das ferramentas, a pressa e a confusão,davam a impressão de aproximar-se o juízo final. E disso quem poderiaduvidar, vendo seis ou sete sacerdotes, os que ali nos achávamos, consumir oSantíssimo Sacramento, despendurar imagens, consumir os óleos (sagrados), recolher os ornamento [...] Em suma, vendo-nos desamparar igrejas tãolindas e suntuosas [...] para que não se convertessem em esconderijos deferas?! [...] Em tempo brevíssimo, fabricaram setenta balsas, que levavammais de 12.000 almas, as quais importavam escaparem deste espetáculohorrendo e calamitoso.41Apesar de as Actas da Câmara não mencionarem diretamente os episódiosrelacionados às entradas ao Guairá, o desenrolar das ações dessa corporação revelamque os homens de São Paulo não se eximiram de armar suas expedições e adentrarem-seao interior, como fica claro nos impedimentos feitos pelos procuradores do conselho àsditas empresas:Aos vinte e sete dias do mês de fevereiro do ano de 1627, reunidos em casasdo conselho, onde se encontravam em Câmara onde seu procurador, atravésde petição, requeria que se notificassem em lugares públicos que ninguémfosse ao sertão.42 Portanto, conforme se tem destacado ao longo do presente trabalho, os autos davereação permitem concluir que os mesmos capitães que congregavam força e violêncianos ataques ao sertão eram os homens bons que, consultados sobre a idoneidade uns dosoutros, se tornavam elegíveis e representavam o rei na câmara e defendiam os direitosda Coroa. Na verdade, os sertanistas-camaristas evidenciavam em seus discursosdirigidos às autoridades régias que as peças trazidas do sertão eram suficientes apenaspara a repartição entre os capitães comandantes das expedições, não lhes sobrandoexcedentes para a mercancia; ou que a mortandade era tão excessiva que colocava osditos capitães em constantes negociações para a obtenção dos indígenas ligados aosaldeamentos jesuíticos, próximos ou vizinhos da vila. O que se destaca, portanto, é aconstância desses homens na luta pela dominação e administração das aldeias, o queabria um abismo nas relações entre eles e os padres da Companhia. Deste modo, nessesmesmos anos a Câmara:
aos dezessete dias do mês de junho de 1630, o povo e os moradores destavila foram requerer dos oficiais da parte de Sua Majestade, que nesta Câmaraestava uma provisão e lei, na qual manda que nas aldeias assista um capitãomor e um clérigo, que saiba a língua e visto que nesta vila haver clérigo parapoder estar nas ditas aldeias, lhe requeriam desse cumprimento à dita lei epara a paz e aquietação e aumento deste povo e que outrossim lhesolicitavam, acudissem as aldeias porque estão alevantadas e não queriamobedecer às provisões do Senhor governador-geral, nem às justiças e oprocurador do conselho disse que a mesma notificação que o povo fazia, ofazia ele também por ser de muito proveito e aumento e aquietação destepovo e república e dizem em tudo, [dar] cumprimento da dita lei e por-se nas aldeias desta vila, clérigos para administrarem os ditos índios ossacramentos, dizendo mais o povo que daria toda ajuda e favor, para que secumprisse a dita lei. E protestando se não o fizessem assim, impondo culpaaos oficiais. E estes que se tomasse e escrevesse o requerimento do povo emandassem o que lhes parecesse justiça, o que de tudo fez o escrivãoAmbrósio Pereira, assinando os ditos oficiais com o povo.43
Eis a lista de assinaturas que ratificavam esta provisão da Câmara referente àorganização e controle das aldeias: [Páginas 76, 77, 78 e 79]
do que as discussões dos problemas da vila.Aos treze dias do mês de junho de mil seiscentos e quarenta e três anos, nacasa da Câmara, estando todos os oficiais juntos, apareceu João Ruiz Preto,que por eleição fora feito procurador do conselho, substituindo Simão RuizCoelho, notificou aos oficiais que escusava o convite de suas mercês, poisestava de partida para fazer viagem para o Rio de Janeiro e que era homemque grageava [sic] sua vida fazendo viagens e assim requeria dispensa, o quefoi consentido pelo juramento feito sob os Santos Evangelhos.12Deste modo, a ação e a interferência da Coroa portuguesa nesse territórioesbarravam nas barreiras naturais e nas ambivalências dos próprios grupos sociais davila. Se havia importantes representantes portugueses na terra, como os Pires e osTaques de Almeida, por outro lado, o bando castelhanista, ainda que cada vez menoslegítimo, soube manter o poder de congregar o povo e defender seus interesses contra osjesuítas, por meio de embargos aos padres que continuavam a ser feitos por uma grandeparte dos habitantes de São Paulo.De qualquer modo, as medidas adotadas pela Câmara em relação aos nativos porvezes soavam falsas, ou, ao menos, distanciavam-se da realidade praticada na vila.Assim, em fevereiro de 1644 , determinava o órgão quenenhuma pessoa os seduza [os nativos] nem incite a saírem de suas aldeiascom suas mulheres e filhos ou sem eles, e que os que os tiverem em suascasas, dentro de um mês, os entreguem às aldeias, com pena de seis mil réis,aplicados ao conselho e trinta dias de cadeia e que para melhor se dar nisto aexecução dos capitães.13Tais resoluções demonstram, de um lado, a tentativa das autoridadesadministrativas em conter as práticas escravistas contra os nativos, conformeprescreviam as leis, e, de outro, a impetuosidade dos sertanistas, que acarretou aexpansão oficial para o centro e para o norte com Antônio Raposo Tavares. No fundo,essas medidas, registradas no discurso camarário, embora proibissem a qualquer pessoa,de qualquer condição, que levassem índios das aldeias de Sua Majestade para fora davila e seu termo, escondem a importância do papel social assumido por essa elite de SãoPaulo, cujo poder estava bem presente entre os armadores que compunham a Câmara.
Nos idos de setembro de quarenta e quatro anos, notificou-se em vereação14que muitos homens, filhos de famílias de moradores desgovernavam estaterra tudo por ordem de seus pais debaixo de cujo poder domínio e proteçãoestavam, que requeria na forma de quartéis que estavam postos seprocedesse contra eles e se fixasse de novo outro, para que se não saíssem desta vila e seu contorno fossem ao sertão sob penas declaradas nasproibições [...].15
O procurador do conselho do ano de 1644, Cosme da Silva, é um dos bandeirantes, personagem ativo do período dos apresamentos.
Atravessando as mais diferentes conjunturas coloniais, as frações das famíliasantigas e poderosas de São Paulo recorreram a uma cultura política que lhes garantissenão só legitimidade na hierarquia interna de poder da vila, como lhes permitisse espaçode barganha na esfera colonial e metropolitana. Com isso, os ânimos se exaltavam. Amanutenção da situação de privilégio de uns significava o desprestígio de outros.4.2. Os FranciscanosPara a atmosfera de conflito pelo poder no planalto entre jesuítas e oficiaiscolonos contribuiu igualmente a atuação dos frades franciscanos, que, muitas vezes, seposicionaram como principais adversários dos inacianos na conquista das almas de SãoPaulo. A fixação dos frades se deu primeiramente no atual Nordeste e na região do ParáMaranhão. Não tardou, porém, a voltar-se para o Sul. Foi justamente na época daocupação de Pernambuco pelos holandeses que essa ação dos franciscanos se tornoumais intensa, configurando uma rápida expansão territorial. No espaço de dezesseisanos, isto é de 1639 a 1655, foram fundados aí seis conventos.Em São Paulo, as atas da Câmara de vinte e seis de novembro de 1639 registram achegada deles à vila, sob a designação de “frades de Antônio”. Os frades pediam aosoficiais que solicitassem aos moradores quecedessem, a títulos de pagamento, suas terras onde poriam os marcos para aedificação do sítio dos padres, fixando-se notificações e convocando osproprietários Calixto da Mota, Jerônimo de Brito e os herdeiros de PauloRuiz, para que seus direitos fossem garantidos, em nome doengrandecimento do serviço de Deus e bem espiritual das almas.16Na realidade, os constantes entreveros entre os homens bons e os jesuítas tinhamaberto amplo campo para a atuação dos frades, muitos deles volantes, além do próprioclero secular, competindo todos de certa forma com os inacianos, apesar da primaziadestes na condução espiritual do império português. Legalizou-se, assim, importanteespaço legítimo como alternativa aos jesuítas, não só quanto às constantes negativas desacerdotes para as bandeiras, quanto à exclusão dos sertanistas das práticas religiosascristãs. Aliás, desde muitos anos os moradores tentavam estabelecer em suas paragens [Páginas 96 e 97]