A violação de um túmulo no cemitério municipal no final do mês de novembro com a finalidade de ‘magia negra’ atiçou a curiosidade de centenas de florenses sobre o real significado dos trabalhos intitulados ‘magia negra’ ou ‘macumba’. Se você ficou curioso para saber sobre os termos, o Jornal O Florense foi atrás de pesquisar mais sobre o assunto e conversou com alguns ‘especialistas’ para fornecer algumas respostas.
Os rituais de magia negra e macumba existem há milhares de anos. De origem africana, a macumba é um instrumento de percussão usado por religiões como a Umbanda e o Candomblé. Consequentemente, a palavra passou a ser usada para designar rituais religiosos em cultos afrodescendentes, mas, muitas vezes, o termo é erroneamente associado a rituais satânicos ou de magia negra.
Já a magia negra tem como objetivo a utilização de rituais com fins malignos ou egoístas, que pode envolver bichos ou ossos humanos – como foi o caso registrado em Flores. Conforme pesquisa, é uma “invocação de espíritos e convocação de forças sobrenaturais para destruir ou aterrorizar inimigos”.
Conforme um florense, que segue a linha do espiritismo kardecista e preferiu não ser identificado, a magia negra sempre existiu. “Quando eu era criança, eu e meus amigos encontrávamos muitos elementos nas encruzilhadas, muito mais do que hoje. Era cachaça, galinha, dinheiro e ainda pegávamos o que nos interessava. Então, sempre houve esses casos em toda a história da humanidade”, conta.
Para ele, o caso de ‘magia negra’ ocorrido em Flores simboliza o clássico intuito de que o interesse em algo é o que move o mundo. “Se eu quisesse fazer um trabalho, teria que dar dinheiro ou energia, que é vida. É preciso dar sangue, coisa viva. Também é preciso ter objetos magnetizados – uma peça de roupa, cabelos, uma foto ou outra coisa que tenha o magnetismo da vítima”, conta ele, que exemplifica. “É como o feitiço do sapo, um dos mais simples que é feito. A pessoa escreve o nome e data de nascimento, coloca dentro da boca de um sapo, costura a boca dele e coloca o sapo perto da residência da vítima. Todo o sofrimento que o sapo vai ter pelo fato de não comer, até que ele morra, vai ser como um perfume negativo que estará rodeando a vítima. Se ela não produz uma energia boa, a energia que está endereçada pra ela pode ir minando. Mas, não existem poderes de matar. São energias geradas por interesses em prejudicar as pessoas, e elas funcionam”.
Porém, de acordo com o espírita, se a pessoa se mantiver confiante em Deus e produzir energias positivas, “a energia ruim não entra. O bem sempre ganha, porque ele está na origem. O mal é uma criação humana”, conta ele, que complementa que “Deus, em seu processo criativo, deu a base para criar a matéria, e o ser humano em vez de amar a Deus sobre todas as coisas, ama mais a matéria”.
A grande procura por trabalhos de magia negra estão em volta de questões particulares, como o amor. “As pessoas possuem dois gênios, o bem e o mal. E independente das escolhas que fazem, elas têm apoio. Se agirmos pelo bem, teremos o apoio do anjo da guarda, da espiritualidade que interage sobre nós. Se formos movidos pelo mal, também haverá apoio, que são esses ‘trabalhos’ que certas pessoas fazem. Mas esse apoio custa dinheiro e sangue”, finaliza.
Direito a liberdade religiosa
A liberdade religiosa é o poder de professar qualquer religião, de realizar os cultos ou tradições referentes a essas crenças, de manifestar-se, em sua vida pessoal, conforme seus preceitos e poder viver de acordo com essas crenças. A liberdade religiosa está relacionada ao conceito de laicidade. E é isso que enfatiza o padre Jocimar Romio, do Santuário Diocesano de Nossa Senhora de Caravaggio, em Farroupilha, sobre as práticas de rituais como magia negra ou macumba. “Não fazemos um pré-julgamento das práticas religiosas. Temos conhecimento sobre a magia e a feitiçaria e temos um posicionamento sobre o assunto. Não temos como controlar ou proibir, mas estamos aqui para orientar as pessoas”, explica. Conforme o sacerdote, o judaísmo condena a prática do encantamento e o catolicismo segue a mesma linha, tendo em seu catecismo – a doutrina da Igreja – abordagens sobre o assunto (veja ao lado). O Papa Francisco na quarta-feira, dia 4, durante sua catequese enfatizou que “essas coisas que são feitas para adivinhar o futuro ou adivinhar muitas coisas ou mudar as situações da vida não são cristãs. A graça de Cristo dá tudo a você: reze e confie-se ao Senhor”.Conforme o padre, a magia é a arte de realizar processos ocultos através de fenômenos inexplicáveis. “É um mistério para obter benefícios: procurar o bem para si ou o mal para outrem”, diz. O padre informa ainda que esses ‘trabalhos’ buscam o auxílio do demônio e de uma força extra-humana do mal. “Deus só quer o bem, mas entendemos que em alguns momentos de aflição as pessoas procuram outras formas para tentar resolver os seus problemas e se deixam levar”, conclui.
O que diz o catecismo católico
- “Todas as formas de adivinhação devem ser rejeitadas: recurso a Satanás ou aos demônios, evocação dos mortos ou outras práticas supostamente ‘reveladoras’ do futuro. A consulta dos horóscopos, a astrologia, a quiromancia, a interpretação de presságios e de sortes, os fenômenos de vidência, o recurso aos ‘médiuns’, tudo isso encerra uma vontade de dominar o tempo, a história e, finalmente, os homens, ao mesmo tempo que é um desejo de conluio com os poderes ocultos. Todas essas práticas estão em contradição com a honra e o respeito, penetrados de temor amoroso, que devemos a Deus e só a Ele”.
- “Todas as práticas de magia ou de feitiçaria, pelas quais se pretende domesticar os poderes ocultos para os pôr ao seu serviço e obter um poder sobrenatural sobre o próximo – ainda que seja para lhe obter a saúde – são gravemente contrárias à virtude de religião. Tais práticas são ainda mais condenáveis quando acompanhadas da intenção de fazer mal a outrem ou quando recorrem à intervenção dos demônios. O uso de amuletos também é repreensível. O espiritismo implica muitas vezes práticas divinatórias ou mágicas; por isso, a Igreja adverte os fiéis para que se acautelem dele. O recurso às medicinas ditas tradicionais não legitima nem a invocação dos poderes malignos, nem a exploração da credulidade alheia”.