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Batalha de Alcácer-Quibir e o mito do sebastianismo. ensinarhistoria.com.br
25 de julho de 2017, terça-feira. Há 7 anos
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Em 4 de agosto de 1578, ocorreu a Batalha de Alcácer-Quibir, no Marrocos, entre as tropas portuguesas comandadas pelo rei D. Sebastião e o sultão do Marrocos. As tropas portuguesas foram dizimadas. O rei D. Sebastião perdeu a vida no combate e a maior parte da nobreza portuguesa foi massacrada e os sobreviventes caíram prisioneiros dos marroquinos. A guerra é considerada um divisor de águas na história de Portugal e de Marrocos: para o primeiro, provocou uma crise dinástica que levou à perda da independência sob a Coroa da Espanha; para Marrocos, a vitória de Alcácer-Quibir firmou o poder do sultanato Saadiano no lado ocidental por mais um século conseguindo resistir à expansão otomana.

A batalha de Alcácer-Quibir marcou, também, o fim da Cruzada cristã contra os muçulmanos, bem como o fim do expansionismo português no norte da África iniciado no século anterior com a conquista de Ceuta.

Domínios portugueses no norte da África

Os portugueses dominavam diversos pontos na costa atlântica do Marrocos e da África Ocidental. Depois de conquistar Ceuta, em 1415, eles capturaram o porto estratégico de Tânger (1471) e Agadir (1505) onde construíram a poderosa fortaleza de Santa Cruz. Este forte controlava a entrada para o Atlântico e fornecia uma base fortificada, a partir da qual podiam aterrorizar a costa marroquina. Foi o primeiro de uma série de fortes que Portugal construiria na costa da África, bem como na Índia e na Malásia.

Seguiram-se as ocupações de outros pontos da costa marroquinas: o porto de Safi (1507), as cidades de Azempour (1513) e Mazagão (1515). Além disso, os portugueses intervieram na política do sul do Marrocos, colocando um emir contra outro e apressando a desintegração política já em curso. Os portugueses também exploravam o comércio escravo e a pirataria na costa marroquina.

O Marrocos estava, naquele momento, em avançado estágio de desintegração social e política. A partir de 1540, Mulei Mohammed, emir do sul do Marrocos organizou a resistência contra a ocupação portuguesa. Expulsou os portugueses do forte de Santa Cruz, a sua principal base de comandando e porta de entrada para o Atlântico. Nos dois anos seguintes, retomou todas as fortalezas ao longo da costa marroquina, exceto Tânger e Ceuta, causando um duro revés ao comércio português.

D. Sebastião e o sonho de conquistar Marrocos

A deposição de Mulei Mohammed em 1576 mudou o cenário político. O emir deposto se deslocou a Portugal onde pediu o seu auxílio para recuperar o trono perdido para seu tio. Em troca, ofereceu a D. Sebastião todo litoral mais seis léguas pela terra firme incluindo as cidades e povoações ali existentes, entre elas, Arzila, Larache e Alcácer-Quibir. Prometeu ainda que deixaria pregar a fé cristã em toda região e, finalmente, consentia que D. Sebastião fosse coroado imperador do Marrocos. A oferta era irrecusável.

Sebastião era muito jovem: assumira o trono em 1568, aos 14 anos de idade e tinha a obsessão de conquistar Marrocos e expandir a fé cristã nas terras muçulmanas. Sua personalidade voluntariosa, impulsiva e autoritária, aliada a uma religiosidade exacerbada e rigidez moral o tornava surdo às ponderações de seus fidalgos.

Não se casara e não fizera herdeiros. Tinha grande dificuldade em se relacionar com mulheres, adiando sucessivamente os possíveis casamentos que lhe foram propostos ao longo da vida.

Os preparativos da guerra

Começou-se a preparar uma grande armada, acompanhada de uma mobilização geral de homens de armas por todo país. Em 24 de junho de 1578, os 500 navios da armada portuguesa deixaram Lisboa rumo à África desembarcando em Tânger.

Era um exército composto por cerca de 15 mil a 23 mil homens, incluindo nobres, generais veteranos, mercenários e aventureiros alemães, castelhanos, holandeses e italianos. A maioria dos soldados era inexperiente, mal preparada e com pouca coesão. O exército estava equipado com 36 canhões.

A gravidade do momento foi bem compreendida pelos marroquinos que proclamaram a jihad contra os portugueses. Vieram combatentes de várias regiões do mundo islâmico. Mosquetes e canhões foram adquiridos dos turcos e dos ingleses.

Três reis estavam envolvidos nesta batalha: D. Sebastião, de Portugal, seu aliado emir Mulei Mohammed, e o sultão Abu Maruane Abdal Malique (que as fontes portuguesas chamam de Mulei Maluco) que tomara o poder. Por esta razão, a batalha de Alcácer-Quibir é muitas vezes referida como a Batalha dos Três Reis.

A 29 de julho, parte do exército português inicia o longo caminho terrestre até Alcácer Quibir. Além das tropas, integrava o grupo engenheiros militares, pajens, criados, lacaios, escravos, carreteiros, cozinheiros e muitas mulheres e crianças. Carros e burros carregavam cevada, água, biscoito, munições, pólvora, roupas, ferramentas, caixotes de dinheiro etc. Segundo alguns cronistas, os não-combatentes eram mais numerosos que os combatentes.

Depois de dois dias caminhando em terreno difícil e sob o sol abrasador do verão africano, D. Sebastião reuniu o Conselho de Fidalgos e decidiu regressar ao ponto de partida para embarcar o exército e atacar por mar. Mas era tarde demais para mudar os planos: os navios já tinham partido para o local combinado anteriormente. O exército retomou a penosa marcha pelo deserto.

A Batalha de Alcácer-Quibir

O confronto começou por volta das 10 horas da manhã do dia 4 de agosto de 1578, na planície de Alcácer-Quibir. O exército português estava esgotado pela fome, cansaço e calor.

As forças marroquinas eram muito mais numerosas reunindo entre 50 mil e 60 mil soldados. Possuíam 26 canhões de grande porte e melhor posicionados.

A artilharia marroquina infligiu pesadas perdas aos portugueses enquanto a cavalaria moura atacou na retaguarda. O ar ficou obscurecido pela poeira dos cavalos e a fumaça dos canhões.

Para agravar a situação, explodiram as reservas de pólvora transportadas pelos carros portugueses. O fogo propagando-se de barril em barril, e de carro em carro, provocou ainda mais desordem e debandada nas hostes de D. Sebastião.

Por volta das 4 horas da tarde, a derrota portuguesa era total em todas as frentes. D. Sebastião reuniu um grupo de sobreviventes para uma derradeira e inútil ofensiva. Mas acabou cercado pelos marroquinos. Recusando a rendição, D. Sebastião foi morto com um golpe de espada na cabeça. Os outros reis também morreram no combate.

O exército português foi esmagado. Dos 15 mil ou 23 mil soldados, estima-se que morreram 8 mil e 16 mil caíram prisioneiros. Menos de uma centena conseguiu fugir para contar a história da derrota. Do lado marroquino foram mortos 3 mil homens.

Muitos dos nobres prisioneiros de Alcácer-Quibir foram resgatados por ouro e prata, o que enfraqueceu o tesouro português. Os que não foram resgatados caíram escravizados ou converteram-se ao islamismo, de forma voluntária ou forçada, integrando-se à sociedade marroquina. Destes, muitos exerceram funções importantes nas obras públicas, no exército e na administração do Estado.

As consequências de Alcácer-Quibir

A batalha de Alcácer-Quibir foi um grande evento na história mundial. Ela é considerada a última cruzada no Mediterrâneo e marcou o fim das ambições cristãs no norte da África. Só no final do século XIX, no contexto do imperialismo, os europeus voltariam a disputar essa região.

Das praças marroquinas que detinha antes da batalha, Portugal recuperou apenas Tânger (até 1661, quando passou para a Inglaterra) e Mazagão (até 1769, quando foi recuperada pelo sultão marroquino). Ceuta passou para a Espanha mantendo-se assim até hoje. O Magrebe permaneceu sob domínio muçulmano.

Os dois líderes islâmicos também morreram em combate. O sultão Mulei Maluco (Abu Maruane Abdal Malique) que se encontrava debilitado por um envenenamento que sofrera, morreu logo no início da batalha. Mulei Mohammed, aliado dos portugueses, morreu afogado ao atravessar o rio Mocazim quando fugia ao massacre em que a batalha se convertera.

Para Portugal, as consequências da derrota de Alcácer-Quibir foram catastróficas. Perdeu a nata de sua nobreza e ficou enormemente endividado para pagar os elevados resgates exigidos pelos mouros para devolver os prisioneiros nobres.

D. Sebastião não tinha herdeiros, deixando como sucessor seu tio-avô, o Cardeal D. Henrique que morreu dois anos depois, também sem descendência. Assim se iniciou uma crise dinástica ameaçando a independência de Portugal face a Espanha, pois um dos candidatos à sucessão era seu tio, o rei espanhol Filipe II que, ao final, assumiu o trono português. Iniciava-se o período da União Ibérica (1580-1640).

O corpo do rei e o mito do sebastianismo

O corpo de D. Sebastião foi considerado “desaparecido” pela população do reino já que não retornou de imediato a Portugal. O rei foi sepultado na casa do alcaide de Alcácer-Quibir e ali ficou durante quatro meses sob a guarda do fidalgo português Belchior do Amaral.

Em 10 de dezembro de 1578, os restos mortais de D. Sebastião foram entregues às autoridades portuguesas de Ceuta onde permaneceram na Igreja do Mosteiro da Santíssima Trindade. Finalmente, em 1582, foram trasladados para o Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, onde se encontram até hoje.

A demora em retornar o corpo de D. Sebastião a Portugal deu margem a muitas dúvidas quando à veracidade da morte do rei. A inscrição em sua tumba é dúbia:

Nesta sepultura se encontra, como se acredita, Sebastião. Uma morte prematura nos campos da Líbia levou-o embora. Mas não diga que é errado quem acredita que o rei ainda está vivo – em face da ordem destruída, a morte era como se a vida fosse.

O mito do sebastianismo cresceu durante a União Ibérica (1580-1640), nascido da esperança de um regresso de D. Sebastião para devolver o país aos portugueses. O mito iria perdurar e ganhar força nos tempos mais difíceis da história de Portugal, sob a crença da vinda de um salvador.

O Sebastianismo traduz a nostalgia de uma idade de ouro que passara e o sentimento de humilhação nacional de um povo ocupado pelo estrangeiro (espanhóis e, mais tarde, os franceses e ingleses), bem como a espera messiânica de um rei capaz de resolver todos os problemas nacionais.

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