30 de janeiro de 2023, segunda-feira Atualizado em 13/02/2025 06:42:31
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por mapas? Em que medida as visualidades de espaços, lugares e territóriosconstruídas por esses agentes coloniais foram aproveitadas pelo Estado na construção da sua visualidade de soberania?Este texto responderá a essas questões. Como já foi mostrado, a culturavisual cartográfica colonial institucional foi derivada das reformas do ensinoda engenharia militar na Península Ibérica ou de seus conflitos geopolíticos emtorno da demarcação de seus limites na América (Cortesão, Alexandre de Gusmão; Bueno; Furtado), mas, para além desses fatores externos ou provenientesdos dirigismos da elite de técnicos e letrados que gravitavam em torno do rei,existiram as contradições e as tensões internas ao ambiente colonial.Portanto, assim como o mapa de Guillaume Deslile de 1720 foi capaz deimpactar as decisões do governo português na política de mapeamento, ao denunciar sua ocupação arbitrária da foz do Amazonas e invasora dos domíniosde Espanha e França na América (Cintra et al., A reforma cartográfica, 195),outros, como o de um sertanista que reivindicava primazia sobre a ocupaçãoe a exploração de terras nos sertões do Tibagi, região correspondente ao atualestado do Paraná, também tiveram a mesma potencialidade.A abordagem contemporânea da experiência colonial mostra ainda o quanto esta só pode ser convenientemente apreendida sob a ótica de hibridismos,interseções e interrelações (Farago; Gruzinski). Os estados da época moderna,por sua vez, foram dependentes dos agentes sociais nas colônias e construíramsuas ficções de Estados soberanos apoiados em seus conhecimentos geográficose à custa de muita negociação (Garcia; Erbig; Lennox). Portanto, a cultura visual institucional está sendo entendida neste texto como ação de apropriação euso da visualidade de campos e sertões de sertanistas e jesuítas para traduzi-los(Bauer e Arredondo) para uma agenda imperial cujos tópicos incluíam sertõesconquistados, fronteiras e des-historicização de memórias grafadas nos espaços,territórios, lugares e paisagens.Embora já exista uma historiografia sobre a produção cartográfica dejesuítas e sertanistas (Cardiff; Cortesão, História do Brasil nos velhos mapas;Oliveira; Barcelos; Dias), poucos pesquisadores a trataram como vetor demudanças político-administrativas da Coroa (Rodrigues), tais como a instalação de governadores nas capitanias encarregados de produzir representaçãovisual das terras interiores do Brasil.O uso dos roteiros e das notícias dos sertanistas, em especial para a confecção de mapas, também é muito mencionado pela historiografia, embora poucosdemonstrem empiricamente como foi feito para o caso de Serro do Frio, região [Página 13]
Na carta que acompanhava esse mapa, seu autor descrevia uma geografia que se estendia das Minas de Goiás aos Pinares, atual região da Vacaria noRio Grande do Sul, mencionando os rios que estariam no crivo mapeador edesenhista da estratégia e da política de comunicação visual do governadorD. Luis, tais como o Paraná e o Paranapanema:De Sn. Pablo hasta la boca del rio Añembi por donde descarga em el Parana grande ciento […] de la boca del rio Parana pane por donde por laparte del Leste descarga em el Parana grande hasta la del rio Tibaxiva.(Cortesão, Alexandre de Gusmão, edição 1951, 116)É consenso na historiografia que a cartografia jesuítica estava ligada aoseu projeto evangelizador (Barcelos; Xavier; Rubiés), e produzir conhecimentogeográfico era uma maneira de a Ordem criar condições para o próprio funcionamento regional. Desde o século xvii, por exemplo, em virtude de ataquesde sertanistas, várias missões foram obrigadas a se deslocar para outros locais.Caso clássico é o do Sete Povos das Missões, estabelecidos nas margens do rioUruguai. Conhecimento geográfico, escrito ou desenhado era, portanto, umamaneira de otimizar a mobilidade quando esta fosse necessária.Alguns autores identificaram na cartografia jesuítica uma função de propaganda das ações evangelizadoras (Rubiés 285; Dias). Alguns desses mapas,inclusive, foram usados para ilustrar a história de suas atuações em váriaspartes do globo. Nas Lettres édifiantes et curieuses écrites des missions étrangèrespar quelques missionnaires de la Compagnie de Jésus (1717), foi editado o mapado rio Maranhão do padre Samuel Fritz, que sugeria a grande hegemonia daCompanhia de Jesus sobre esse território (Dias 113).Em 1755, Pedro Lozano publicou Historia de la Companhia de Jesus dela Provincia del Paraguay e, conforme concluem alguns historiadores, o Mapade las Missiones de la Compañia de Jesus, do geógrafo e cartógrafo jesuíta JoséQuiroga, feito em 1749, tinha como destino imediato complementar esse escrito (Costa 155).Essa cultura visual de território construída pelos missionários era entrecruzada e misturada à dos sertanistas de São Paulo, pois ambos carregavammemórias diferentes, mas construídas na ação e na itinerância em espaçoscomuns. Como já foi mostrado por vários teóricos, espaço, território, lugar epaisagem não são mera topografia, mas cultura e memória (Cosgrove; Schama). Assim, enquanto os jesuítas viam essa região associada ao seu trabalho de [Página 20]
Desde o século xvii, exploradores de sertão ou sertanistas, como eramchamados os mamelucos de São Paulo, percorreram as vias terrestres e fluviaisque formavam a região platina. As bandeiras de Antonio Raposo Tavares sãouma das mais citadas e mereceram estudos monumentais. Seus integrantesdevassaram os campos gerais, descendo pelos rios Iguaçu, Pequiri, Tibagi,Ivai (Cortesão, Raposo Tavares). Nas peregrinações pelos sertões para caçar eescravizar índios ou descobrir zonas minerais, esses sertanistas construíramuma expertise de práticos e conhecedores dessas terras do interior, forjaram suaprópria identidade de Paulistas com “p” maiúsculo, como a eles se dirigiam asautoridades coloniais.Mas essa expertise da geografia dos sertões, quando acompanhada dedesenhos, inquietava as autoridades coloniais, pois, no século xviii, eram revestidos de autoridade política tanto para a construção de impérios soberanoscomo para a reivindicação de direitos sobre terras (Lennox 4), como sugereo comentário feito por um secretário de Estado sobre um geógrafo genovês cujosserviços foram contratados avulsamente pela Coroa para escrever projetos demapeamento e desenhar mapas na década de 1750:um homem que tinha pisado tanto o sertão do Brasil e que não ignorava a geografia e topografia de muita parte destes vastos domínios, eque se sabia explicar não só na conversação mas também por carta geographica […] não era justo deixa-lo ir para países estranhos, e que eramais conveniente socegar-lhe a paixão. (ahu, arj, 1756, cx. 50, d. 4983)Esse secretário em mesmo ofício manifestou ainda seus temores com relação aos sertanistas de São Paulo, como um chamado Angelo Pedroso e seustrânsitos pelas terras do Tibagi englobadas pela vasta região platina. Segundoele, “este Tibagi nos dá sempre em que cuidar”. Esse sertanista queria “justificarter entrado no sertão do Tibagi ter dado princípio a descobrir as minas de quejá trouxe as amostras” (ahu, arj, 1756, cx. 50, d. 4983).Acontece que esse sertanista sabia conversar sobre território por cartageográfica e havia contratado um escrivão da câmara, Manuel Angelo Figueirade Aguiar, que, em 1755, desenhou o mapa abaixo para endossar sua petição dedireitos de exploração sobre essas terras enviada ao Conselho Ultramarino (ahu,asp, 1755, cx. 4, d. 282).Era justamente comunicar por desenho, ou seja, construir uma culturavisual das terras do interior de uma região ibérica, como a platina, que a Coroaportuguesa tinha de aprender para sobrepor as suas imagens territoriais às dos sertanistas e jesuítas. Assim, para enfrentar esse problema, a Coroa decidiu investir na reforma do ensino da engenharia militar e contratar governadores deperfil oculocentrista e engajados na produção de conhecimento cartográfico.A escolha de D. Luis de Souza como governador da capitania de São Paulofez parte, portanto, de um plano mais amplo de fomentar o desenvolvimentode uma cultura visual institucional das terras platinas diante das pressões dessacultura visual preexistente e para superar o déficit do Império de registro visualdessa região de soberania incógnita ocupada por grupos indígenas autônomosou missionados, percorrida por sertanistas e que, desde o século xvii, anunciavaser rica em jazidas auríferas e de diamantes (Reis).No próprio projeto escrito por esse governador em julho de 1768, cincomeses antes de iniciar os trabalhos de mapeamento da região, já era mencionadaa razão de sua contratação: as representações feitas em 1764 por um coronel e“outros Paulistas” para penetrarem os matos de Guarapuava até a Serra Apucarana (ahu, asp, 1768, cx 25, 2411). [Páginas 24 e 25]
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